Viana do Castelo: Câmara assume transportes urbanos em setembro. Oposição com dúvidas sobre a implementação e viabilidade

A poucos meses do fim do contrato de concessão com a Transcunha, a Câmara Municipal de Viana do Castelo prepara-se para assumir a operação direta do serviço público de transportes urbanos. A mudança estrutural está prevista para o dia 23 de setembro, mas a transição para um novo modelo ainda deixa algumas dúvidas, especialmente por parte da oposição.

Micaela Barbosa
9 Jun. 2025 6 mins

Na reunião extraordinária do Executivo municipal, o projeto de regulamento do novo serviço, que entrará em discussão pública durante 30 dias, foi aprovado, com as abstenções do CDS-PP e do independente Eduardo Teixeira.

A vereadora do CDS-PP, Ilda Novo, questionou a operacionalização da rede, alertando para o risco de falhas operacionais, invocando a autonomia limitada dos veículos elétricos, a necessidade de reservas por tipologia, e a impossibilidade de garantir todas as frequências previstas com apenas 13 a 14 viaturas disponíveis em simultâneo. “As 14 viaturas terão de fazer o máximo de horários consecutivos, mas a sua autonomia, dado que todas são elétricas, não irá permitir que se conclua a jornada de trabalho, pois tem de haver tempo – e não é pouco, atualmente -, para o carregamento das baterias”, expôs, argumentando que, “partindo do pressuposto de que, efetivamente, [a edilidade] irá adquirir os restantes 2 mini, ainda assim precisará sempre, no mínimo, de uma reserva midi e de uma reserva mini”. “Sobram, apenas, 13 para fazer tudo”, alertou.

Outra das preocupações prende-se, segundo a vereadora, com “os indicadores económico-financeiros previstos no Anexo I” que “parecem ser mais adequados a autoridades de transporte que não internalizaram o serviço”. “Não parecem contemplados os gastos próprios do município com a operação, sendo certo que esse seria o indicador fundamental para aferir do equilíbrio económico-financeiro do serviço público de transportes”, apontou, referindo que, “não tendo a Câmara criado uma empresa própria para o efeito, com contabilidade autónoma”, o CDS vê como “muito difícil que se consigam apurar devidamente os custos deste serviço, que, desta forma, poderão acabar camuflados com os custos das restantes valências dos serviços”.

Ilda Novo alertou, ainda, para os sistemas operacionais de bilhética, informação ao público e planeamento da rede. “O prazo para apresentação das propostas termina às 17h00 do dia 26 de agosto, sendo que os concorrentes são obrigados a manter as propostas durante 66 dias a partir daquela data”, afirmou, considerando: “É significativamente escasso o período de tempo que resta até ao término do atual contrato de concessão do serviço público de transporte coletivo de passageiros, que ocorrerá no final de 2025.”

Ademais, a vereadora levantou dúvidas sobre a fiscalização do serviço, e lembrou os custos acumulados com aquisição e infraestrutura necessária para a operação do novo serviço. “O financiamento à aquisição dos autocarros elétricos pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), apesar de se justificar e ter como “objetivo continuar a prestar o serviço anteriormente estabelecido com os munícipes, mantendo a rede existente”, só cobrirá o diferencial entre o valor de um autocarro a gasóleo e o de um elétrico, incumbindo à Câmara o pagamento do restante, que é um custo direto”, alertou, acrescentando: “Se contabilizarmos a bilhética e o sistema de exploração – e sem esquecer que ainda estão por adjudicar os miniautocarros e, bem assim, que serão necessários, com toda a certeza, mais alguns autocarros de reserva -, temos que já estão gastos ou destinados mais de 4,5 milhões, sem andar um km.” Neste sentido, Ilda Novo afirmou que, “faltando apenas alguns meses para terminar o contrato de concessão, cujo fim implicará a suspensão imediata da prestação do serviço, a complexidade do procedimento ainda em curso poderá comprometer a mobilidade dos vianenses”.

Já o vereador independente, Eduardo Teixeira, levantou “dúvidas” quanto ao projeto, “apesar das convicções” do autarca.

“A nossa preocupação é disponibilizar um serviço”

O presidente da Câmara Municipal, Luís Nobre, assegurou que a autarquia “já tem uma equipa de fiscalização”, sublinhando que o projeto nasce da “convicção de criar um serviço com mais qualidade”. “Tudo será garantido”, assegurou, reforçando: “A nossa preocupação é disponibilizar um serviço. Mais que ser sustentável financeiramente nos primeiros meses, é que venha facilitar a mobilidade aos nossos concidadãos”.

No final, em declarações aos jornalistas, o autarca explicou que o regulamento parte de uma base já implementada, reconhecendo que o município terá de “fazer uma avaliação anual das condições económicas e sociais”, para “agilizar medidas e soluções de mitigação de algum momento mais exigente”.

O projeto de regulamento estipula “as regras e condições a que devem obedecer o planeamento, a organização, a operação, a atribuição, a fiscalização, o investimento, o financiamento, a divulgação e o desenvolvimento da rede do serviço público de transporte de passageiros, por modo rodoviário, a levar a cabo, de forma direta, pelo Município de Viana do Castelo”. Contudo, como o próprio preâmbulo do documento reconhece, a operação do serviço depende ainda da emissão de um parecer prévio, vinculativo e favorável da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT). Segundo a vereadora responsável, Fabíola Ponte, o estudo já foi remetido à AMT “por acordo prévio”, mas o parecer ainda não está disponível no site da entidade reguladora.

Tribunal dá razão à Câmara Municipal

Em janeiro deste ano, a Transcunha interpôs uma ação judicial, alegando “graves indícios de ilegalidade” na internalização do serviço. O Tribunal de Trabalho deu agora razão à Câmara, reconhecendo que não existe obrigação legal de absorver os motoristas da atual concessionária.

Luís Nobre, que anunciou a decisão judicial durante a reunião extraordinária do Executivo municipal, referiu que a decisão “ainda é passível de recurso”, mas sublinhou que o município “fez tudo bem neste processo”, tendo pedido pareceres à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), à Autoridade da Mobilidade e dos Transportes (AMT) e à ACT-Autoridade para as Condições do Trabalho. “O período da concessão [da Transcunha] vai ser respeitado. Termina a 22 de setembro e, a partir daí, teremos de garantir a continuidade do serviço”, afirmou.

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