José Lago Gonçalves: “O PSD prejudicou-se a si mesmo” 

Foi em 1994 que o PS “roubou” a Câmara de Viana do Castelo ao PSD. Depois do mandato de Defensor Moura e, posteriormente, de José Maria Costa, José Lago Gonçalves, presidente da Juventude Social Democrata (JSD) do Alto-Minho, advogado de 27 anos, considera que as eleições autárquicas de 2021 foram “uma grande oportunidade” perdida. E, se muitos “dentro do PSD, ainda entendem que se perdeu a Câmara por injustiça”, já lá vão mais de 25 anos, José Lago não tem medo de reconhecer que, na última chance, o partido “prejudicou-se a si mesmo”.

João Basto
26 Mai. 2023 7 mins
José Lago Gonçalves: “O PSD prejudicou-se a si mesmo” 

Tem, como um dos seus objetivos, combater a cultura do “yes man” na juventude partidária e fomentar o “pensamento crítico”, mas identifica três problemas urgentes no Alto-Minho: a oferta de emprego, o problema da habitação e a fixação dos jovens. “Temos, claramente, índices que demonstram que Viana do Castelo está a perder população, não só na cidade, como nos concelhos. (…) É um problema transversal ao país todo, mas há jovens que vão para outras cidades, e outros acabam mesmo por emigrar, porque não veem oportunidades em Portugal, e em Viana do Castelo, para corresponder àquilo que foi o seu investimento”, afirma. Acerca de um dos casos, dá um exemplo pessoal: “Quando, em 2013, entrei para a faculdade, em Coimbra, pagava 160 euros por um quarto e morava a dez metros da faculdade. Hoje, em Viana do Castelo há quartos a custar 300 euros”, conta.

Do passado e do presente 

Recuando no tempo… Foi quando José passava do terceiro ciclo para o ensino secundário que Portugal se via a braços com “um enorme aumento de impostos”, como Vítor Gaspar, então ministro das Finanças do Governo liderado por Pedro Passos Coelho, anunciara. Foi, também nessa ocasião, que se juntou à JSD. Perante a perplexidade diante desta decisão, em especial, para quem é originário de uma família “não muito pró-memorando da troika”, com uma mãe funcionária pública, um pai empresário e uma avó pensionista. Todo um grupo particularmente visado pelas medidas de austeridade. José Gonçalves responde que a leitura que fazia o levava a entender que “era preciso arrumar a casa”. Mas, mesmo admirando “o espírito de missão do Primeiro-Ministro da altura”, assume que “o PSD sacrificou muito as pessoas” nesse período, reconhecendo que isso ainda é um peso para o partido. 

Do passado para o presente, a sombra parece ter-se tornado no Chega. Na altura em que a entrevista foi realizada, eram recentes as declarações do líder da JS pedindo que a JSD se demarcasse do partido de extrema-direita. José fala em aproveitamento e especulação, e lamenta que se procure passar a “dinâmica nacional para as juventudes partidárias”. “As juventudes partidárias devem olhar, em primeiro lugar, para aquilo que são os problemas dos jovens, e, em segundo lugar, preocupar-se com discutir qual será o destino de uma putativa solução de governo para o país”, disse. Mas, questionado se é ou não aceitável, desejável ou expectável, uma união com o Chega, é perentório: “Eu gostava que o meu partido fizesse aquilo que eu fiz aqui. Ou seja, dizer ‘Com o Chega nunca!’, afirma, reiterando: “A JSD demarca-se de políticas xenófobas, racistas e de extrema-direita.” 

A seu ver, é o “Chega que tem a batata quente na mão” e não o contrário, da mesma forma que considera “mais preocupante a falta de interesse dos jovens para com os partidos em geral, do que o putativo interesse de alguns jovens por partidos radicais”. Quanto à possibilidade de um “fenómeno Trump” em Portugal, acredita que tal não acontecerá se existir, como acredita que existe, “um líder da oposição (…) capaz de se afirmar como alternativa com um discurso de oposição vinculado”.

Insuficiências 

Regressando aos problemas do AltoMinho, José Gonçalves aborda, num largo encadeamento, vários pontos a ter em conta. Defende uma atitude que não só cuide do património natural, mas que também permita potenciar a sua dimensão económica. “Um exemplo disso é a forma como é gerido o Parque Nacional Peneda-Gerês, se compararmos Braga e Viana do Castelo”, explica. No entanto, centra a sua argumentação na dificuldade de fixação de jovens e na falta de oferta de habitação, “que possa tornar o território atrativo”. Segundo afirma, um dos obstáculos é não haver opções que correspondam a “toda uma nova realidade de ver o trabalho, que permite às pessoas organizarem a sua vida de maneira a viver em dois sítios”. “Precisamos de ter algo que se note nas nossas carteiras relativamente à habitação, ao custo de vida, à capacidade de compra de casa. Se uma grande parte do nosso salário, que já não é muito em início de carreira, vai para a habitação, pouco mais sobra”, defende, acrescentando: “Não há capacidade de compra, porque as taxas de juro estão muito altas, não há capacidade de construção porque o material está caro e a mão-de-obra é escassa, não há para alugar, porque as rendas sobem a preços galopantes.”

Quanto às recentes medidas governamentais sobre esta matéria, a sua desilusão não podia ser maior. “O Porta 65 não dá resposta àquilo que são as necessidades dos jovens”, lamenta. Argumenta que devia haver um alargamento do programa, que há condicionantes que impedem uma candidatura a benefícios legítimos, e que os próprios municípios podiam ter “uma política de apoio à emancipação de jovens, nomeadamente, através da isenção do IMI ou do IMT”, medida que, acredita, deve ser implementada em todos os concelhos do Alto-Minho. 

Porém, José Lago vê na mobilidade um dos capítulos mais negros da vida do distrito de Viana do Castelo. Exige que a “Comunidade Intermunicipal do Minho-Lima (CIM do Alto Minho) tenha uma posição concertada relativamente às novas linhas de ferrovia”, no âmbito do programa Ferrovia 2020, e adverte para a necessidade de um “estudo aprofundado” das necessidades da região, antes de um investimento de oito milhões de euros na mobilidade distrital. “Melgaço só tem saída através de Monção, e Monção não tem ligação direta à autoestrada. (…) Uma pessoa que se sinta mal em Melgaço, e não tenha a possibilidade de ser assistida no primeiro hospital de urgência, que é Monção, já viram que trajeto tem de fazer?”, questiona.

“Um balde de água fria” 

Da oportunidade eleitoral perdida em 2011 ao “balde de água fria” que foi a derrota das últimas Legislativas, tentou-se perceber até que ponto a vida partidária é uma vida de traições, pequenos jogos de interesses, de golpes de bastidores. A resposta é afirmativa. “Podia dizer-lhe que é tudo muito plural. Mas há luta interna, há questões que, muitas vezes, prejudicam, e muito, o partido durante anos, porque há pessoas que não são capazes de se sentar à mesma mesa para conversar”, refere. “E muitas delas”, acrescenta, “prejudicam a possibilidade de, por exemplo, o PSD ganhar a Câmara em Viana do Castelo”. 

Contudo, garante que, se os jovens quiserem mudar o país, o caminho será fazê-lo através dos partidos, até porque essa é, também, uma necessidade do próprio sistema político institucionalizado. “Se as pessoas se esconderem sempre e tentarem fugir, vai conduzir-nos a este marasmo em que há pouca evolução política, porque os melhores não querem estar”, alega, afirmando: “As pessoas estão desligadas e não estão prontas para deixar o conforto profissional e financeiro que a Academia ou o sector privado lhes dá, para irem servir numa causa público que é feita de casos diários e verem a sua imagem denegrida na praça pública”. O que leva José a defender que a valorização, inclusive financeira, da ação política, diminuiria, até, a possibilidade de corrupção. 

O mesmo raciocínio se estende à religião. Assumindo-se como crente, vê a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) como um momento histórico, e elogia a atuação da Diocese de Viana do Castelo na crise dos abusos sexuais de menores, mas julga ser necessária uma “reformulação” na prática e no ambiente da fé cristã. “Isto acaba por ser como na política. Se eu quiser juntar numa sala um conjunto de jovens, se os fechar todos numa sala, com bom tempo, mesmo que chame dois ou três bons interlocutores, o que é que acham que vai acontecer? Passados 10 minutos estão todos no telemóvel”, finaliza.

Tags Entrevista

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