De um modo geral, a inovação tecnológica tem sido uma mais-valia para o nosso dia a dia. Um exemplo disso é o avanço da medicina, onde a investigação, aliada à tecnologia, tem permitido melhorar significativamente a qualidade de vida de milhares de pessoas. No entanto, quando falamos da digitalização de serviços, como por exemplo nas telecomunicações ou na banca, temos assistido a uma parte da sociedade a ficar para trás.
Com a transição dos serviços e processos para o meio digital, passa a ser possível fazer quase tudo através da internet ou do telefone, desde a marcação de consultas médicas até à gestão de assuntos bancários, e tudo isto, com a promessa de simplificar processos e assim facilitar a vida da população.
No entanto, muitas pessoas enfrentam sérias dificuldades para realizar tarefas básicas que anteriormente eram facilmente resolvidas de forma presencial. Afinal, será que toda a população tem a vida mais facilitada?
Apesar de existirem normas relativamente à acessibilidade web, como por exemplo a Diretiva Europeia da Acessibilidade Web que obriga todos os websites e a aplicações móveis (apps) dos organismos públicos da União Europeia a ser mais acessíveis para os utilizadores, em especial para pessoas com deficiência, continuamos a encontrar páginas com graves problemas em termos de acessibilidade.
Isto não se aplica apenas aos organismos públicos, no setor privado, acontece o mesmo.
De acordo com o site acessibilidade.gov.pt, em 2023 cerca de 1,1 milhões de pessoas (10,9% dos portugueses) apresentavam pelo menos uma incapacidade, seja visual, auditiva, motora ou cognitiva.
Para estas pessoas, navegar pela internet pode ser um verdadeiro desafio, e, muitas vezes, acaba mesmo por ser impossível.
Por exemplo, muitas páginas de internet ainda não são compatíveis com leitores de ecrã (programas que transformam o conteúdo visual das páginas em áudio, utilizado maioritariamente por pessoas com incapacidade visual). O resultado? Milhares de pessoas são excluídas do acesso à informação e do acesso a serviços essenciais.
Quem nunca se sentiu num labirinto após ligar para um serviço? As mensagens automáticas indicam: marque “1”, marque “3”, marque “4”, agora marque “#” e no final a chamada simplesmente cai ou nunca conseguimos chegar ao contacto humano.
Se para quem cresceu rodeado de tecnologia este tipo de situação acaba por ser frustrante, imagine-se para a restante população.
Muitas empresas e instituições continuam a ignorar o facto de que existe um grande número de pessoas que necessita de um atendimento humano personalizado, em vez de um sistema automatizado e complexo.
Quando recorremos a um serviço com a obrigatoriedade de retirar uma senha, ser recebidos por uma máquina com diversas opções pode ser assustador. Para quem não está familiarizado com ecrãs tácteis e interfaces modernas, esta pequena ação acaba por ser uma barreira, acabando mesmo por se ficar dependente de estranhos para realizar a simples tarefa de retirar uma senha, contribuindo assim para um sentimento de impotência e exclusão.
Uma vez que nem toda a gente possui literacia digital, deveriam ser disponibilizadas alternativas mais acessíveis e humanizadas. Além disso, muitos destes dispositivos não garantem a devida acessibilidade, excluindo mais uma vez pessoas com limitações visuais, motoras ou cognitivas.
A inovação tecnológica, associada à digitalização, deve ter como principal objetivo facilitar a vida de toda a população e ser pensada para todos. Cabe-nos a nós, enquanto sociedade, garantir que a acessibilidade digital é uma prioridade, seja no setor público ou privado, assegurando que ninguém fique para trás.
Devemos colocar-nos no lugar do outro e assegurar que tudo o que criamos ou implementamos – seja na nossa loja, empresa, associação ou instituição – responde verdadeiramente às necessidades de toda a população.
Se a tecnologia é o futuro, esse futuro deve ser inclusivo. Caso contrário, em vez de unir, continuaremos a criar barreiras invisíveis.
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