Instituição dos seminários A consciência de que a promoção das vocações sacerdotais é catalisadora da renovação da Igreja ficou bem explícita não só a partir do Concílio de Trento (1545-1563), como também depois do Concílio Vaticano II (1962-1965), dois marcos históricos da construção da identidade da Igreja, cada um no seu tempo. É certo que, […]
Instituição dos seminários
A consciência de que a promoção das vocações sacerdotais é catalisadora da renovação da Igreja ficou bem explícita não só a partir do Concílio de Trento (1545-1563), como também depois do Concílio Vaticano II (1962-1965), dois marcos históricos da construção da identidade da Igreja, cada um no seu tempo.
É certo que, desde os primeiros séculos, a autoridade esclesiástica havia revelado um cuidado especial pela instrução e formação das jovens vocações chamadas ao sacerdócio, estabelecendo normas a respeito, como atestam os Concílios Lateranenses III e IV.
No entanto, seria o decreto tridentino «Cum adolescentum aetas», aprovado em 15 de Julho de 1563, a instituir a obrigatoriedade dos bispos fundarem nas suas dioceses colégios para adolescentes, a partir dos 12 anos, que dessem esperança de vir a dedicar-se ao ministério eclesiástico, de tal modo que cada um deles constituísse um viveiro de ministros de Deus («ut hoc collegium Dei ministrorum perpetuum seminarium sit»).
Embora não se tratasse verdadeiramente de uma novidade, tendo em consideração a existência de alguns colégios anteriores ao concílio tridentino em algumas cidades da Europa, o certo é que os padres conciliares encontraram na instituição dos seminários uma semente de novidade na estreita relação entre a renovação da Igreja e o ministério sacerdotal.
Voz de referência em Trento, o arcebispo de Braga D. Frei Bartolomeu dos Mártires (1514-1590), que havia participado no terceiro período do concílio (1562-1563), em que fora manifestada a preocupação pela fundação de casas de formação para os futuros sacerdotes, foi o primeiro a fundar um seminário.
A importância extraordinária dos seminários na vida da Igreja foi, entretanto, sendo confirmada, ao longo dos séculos, pelo magistério da Igreja e pelos Santos Padres, nomeadamente pelo papa Leão XIII (1810-1903), convicto de que a sorte da Igreja estava estreitamente ligada ao estado dos seminários.
A convicção fortaleceu-se no Concílio Vaticano II, focado na renovação da Igreja, de que resultou o decreto «Optatam totius» (28-10-1965), fonte primordial ainda no tempo presente, onde se proclama a transcendental importância da formação sacerdotal e se expõem os princípios fundamentais que devem inspirá-la, conservando e confirmando o que a experiência de séculos tem vindo a demonstrar.
O referido decreto conciliar reafirma a necessidade do seminário maior, diocesano ou interdiocesano, para a formação sacerdotal, assim como a vigência e utilidade do seminário menor, construído «para cultivar os gérmenes da vocação», e pede que se considere a instituição do seminário como o «coração da diocese».
Além disso, o «Directório para o Ministério Pastoral dos Bispos» («Ecclesiae Imago», 22-02-1973) considera que, entre as instituições da diocese, o Bispo tenha como principal o seminário, pois dele depende o contínuo e fecundo ministério sacerdotal da Igreja (n.º 191).
A actualização do documento da Congregação dos Bispos («Apostolorum Successores», 22-02-2004) reitera, por sua vez, que, «entre todas as instituições diocesanas, o Bispo deve considerar como a primeira de todas o Seminário, fazendo dele objecto dos mais intensos e assíduos cuidados do seu ofício pastoral, porque dos seminários dependem em grande parte a continuidade e a fecundidade do ministério sacerdotal da Igreja» (n.º 84).
Antecedentes
Indissociável do ser Igreja diocesana, a instituição do seminário era a prioridade das prioridades, uma convicção tão manifesta antes como nos anos que se seguiram à criação da diocese de Viana do Castelo.
Quando, na primavera de 1918, como voz que clamava no deserto, o padre José Luís Zamith (1867-1926) lançou o repto aos vianenses para reunirem esforços com vista à criação da diocese de Viana do Castelo, sublinhava que, «após a creação do bispado, tem de vir, mais tarde ou mais cedo, a creação d’um seminário, onde os candidatos ao sacerdocio possam educar-se mais perto de suas familias do que agora, o que diminuirá, por certo, despezas de certa ordem, sendo de crêr que o numero de aspirantes do estado clerical, hoje tão pequeno, por serem irrealisáveis muitas vocações, augmente com a facilidade de as aproveitar».
Sem preconceitos, a visão do padre Zamith preconizava, inclusivamente, vantagens económicas para a cidade de Viana do Castelo com a instalação não só do paço episcopal, como também de um seminário.
Mais tarde, em 1964, a comissão de altominhotos pró-criação da diocese vianense apresentava a sustentabilidade de um seminário como um dos argumentos a favor da causa: «uma das razões para a necessidade da criação da Diocese de Viana do Castelo provinha do bom número de sacerdotes e de seminaristas e da possibilidade de sustentar o Seminário».
Aliás, nas petições dirigidas à Santa Sé em favor da criação da diocese, o convento de São Domingos figurava como lugar que serviria para o seminário, enquanto não fosse construído um novo.
Instituição
Criada a Diocese de Viana do Castelo (03-11-1977), D. Júlio Tavares Rebimbas (1922-2010) não tardou, assim que dela tomou posse como primeiro bispo, em 8 de Janeiro de 1978, em instituir canonicamente o Seminário Diocesano, com sede em Darque, consagrando-o à protecção de Santa Maria Mãe da Igreja e de São Teotónio, o que fez por provisão com data do dia 13.
No cumprimento do direito administrativo e concordatário, a erecção canónica do Seminário Diocesano de Viana do Castelo foi participada ao Governo Civil no dia 16 de Janeiro de 1978.
Desta forma foi dado o primeiro passo com vista a responder a uma das preocupações enunciadas por D. Júlio na ocasião em que tomou conta dos destinos da recém-criada diocese.
Nas palavras do arcebispo-bispo, «os seminários continuam a ser ‘o coração da diocese’ apesar da frase estar muito repetida. Não podem o bispo e a comunidade diocesana deixar de ter no coração o apego aos seminários, a preocupação dos seminários, a absorção dos seminários no que eles têm de instituição educadora e de formação dos futuros padres».
Acrescentou também que «no processo de enraizar a diocese nos fundamentos que lhe permitam um desenvolvimento integral, havemos todos de trabalhar para que os nossos futuros padres possam receber o melhor possível para o distribuir o melhor possível no serviço efectivo dos irmãos».
À data, frequentavam os seminários da arquidiocese de Braga aproximadamente 80 seminaristas oriundos de diversas localidades do distrito de Viana do Castelo, sendo que apenas 5 deram entrada pela primeira vez, e aguardava-se a ordenação de um presbítero, pelo menos, ainda no primeiro ano da diocese.
Perante o panorama sucintamente exposto, D. Júlio Tavares Rebimbas concluiu: «sem outros comentários fica a igreja de Viana prevenida. Saúdo os nossos jovens seminaristas e digo-lhes da minha experiência o que eles já sabem por seu ideal: vale a pena ser padre no nosso tempo».
Projecto de futuro
Nos princípios de 1980, a publicação da «Carta Pastoral sobre a renovação das paróquias do Alto Minho» serviu de base para o trabalho de actualização e renovação da Igreja diocesana.
Para além de referir que a diocese não tinha sacerdotes suficiente para as suas necessidades, apontava como obras prioritárias para o crescimento da diocese quer a oração, a catequese e as obras de caridade e assistência, quer a obra das vocações e seminários.
Em 13 de Janeiro de 1980, dia do encerramento da II Semana da Diocese, D. Júlio propunha para o futuro «estudar e dialogar sobre as hipóteses de um edifício para seminário diocesano», sendo certo que o convento de São Domingos havia sido destinado aos serviços centrais e obras da paróquia de Monserrate.
A importância dos seminários, instituídos para formar padres para o seu tempo, foi sublinhada por D. Júlio, em 23 de Janeiro, na ordenação de 4 diáconos e instituição de 5 seminaristas no ministério de leitor, onde vincou que «ser hoje seminário não é certamente ser seminário de ontem».
Falava assim induzido pela experiência que teve enquanto seminarista em vários seminários de várias dioceses, como padre em contacto com o seminário da sua diocese, pela experiência de bispo em várias dioceses com vários tipos de seminário e em épocas conturbadas.
Daí que, com autoridade e experiência, afirmasse que, «no investimento de meios de evangelização da nossa Diocese, uma das mais prementes necessidades é a construção e funcionamento de um seminário em Viana do Castelo».
À data, a Diocese contava, para além dos quatro diáconos, com 214 presbíteros, 91 dos quais com mais de 50 anos. Nos seminários de Braga frequentavam 75 seminaristas até ao 11.º ano de escolaridade e, no curso de Teologia, apenas 17, dos quais 11 pertenciam aos 2.º e 3.º anos.
A preocupação
O assunto do Seminário Diocesano tornou-se recorrente não só nos discursos do Bispo, como também nas reuniões dos conselhos presbiterais.
Na quarta reunião, decorrida entre 21 e 22 de Março de 1980, o Conselho foi de parecer que a Quinta de São Lourenço, em Darque, não seria o local mais indicado para a implantação do Seminário Diocesano, pelo que foram apresentadas outras alternativas, sempre dentro de uma área não muito distante da cidade de Viana.
A reunião do Conselho Presbiteral, realizada em 9 de Julho, também tratou do assunto, que foi desenvolvido por D. Júlio na entrevista concedida ao «Notícias de Viana», órgão de comunicação oficial da diocese, na edição de 17 de Julho, onde apontou a necessidade da existência do edifício do seminário, que não era só uma preocupação sua, mas também de toda a comunidade diocesana, enquanto fomento da própria identidade.
Para D. Júlio, a menos de vinte dias de ordenar seis presbíteros, três diocesanos e outros tantos religiosos, «o seminário é uma das grandes preocupações de qualquer Bispo e de qualquer Presbitério, em qualquer diocese: quando se tem e quando se não tem. Nele conflui e dele dimana a vida da igreja local. Nós temos ‘seminário-instituição’ (o Seminário Diocesano de Viana do Castelo), temos alunos, mas não temos casa nossa, não temos edifício. As consultas feitas e o que vou ouvindo não admitem dúvidas. A Diocese de Viana do Castelo necessita de um Seminário Menor. Onde, quando e como o faremos, é o diálogo que existe entre nós. Entretanto os nossos alunos continuam a frequentar os Seminários de Braga».
Sublinhou ainda que a falta de um seminário era preocupante, porque «uma diocese nova (ou qualquer Diocese) para a sua própria identidade, necessita de respirar os ares do seu Seminário, de o sentir, de o ver e de se preocupar com ele e com os seus problemas. A Diocese quer e há-de ter o seu Seminário-edifício».
Na visão do primeiro bispo vianense, «no plano das concretizações será possível (e é muito desejável) que para o fim do ano corrente, ao menos por altura da ‘terceira semana da diocese’, se possa anunciar alguma coisa mais sobre o Seminário. Depende de vários factores que, por seu lado, estão condicionados pela agilidade ou morosidade de certos sectores de ordem técnica e de ordenamentos urbanísticos. Esperemos poder andar mais depressa, e a esperança é sempre uma grande virtude».
(continua na próxima edição)
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