Em plena Quaresma, um período dedicado à reflexão, partilha e oração, eis que surge um fenómeno (outro?!) que nos faz questionar os nossos hábitos de consumo: a corrida desenfreada ao famoso “chocolate do Dubai”. Este doce, que ganhou notoriedade nas redes sociais, tornou-se o centro das atenções nos supermercados portugueses. Mas o que nos leva a açambarcar este chocolate de forma tão devoradora (diria, até, irracional)?
Recordemos os tempos não tão distantes da pandemia de COVID-19, quando o papel higiénico se tornou o bem mais precioso nas prateleiras dos supermercados. As pessoas corriam desenfreadamente para garantir o seu stock pessoal, deixando muitos sem acesso a um produto básico. Agora, parece que repetimos o mesmo comportamento, mas com uma guloseima. Será que não aprendemos nada sobre a importância de pensar no próximo?
A Quaresma é um período que nos convida à introspeção, à partilha e ao desapego dos excessos materiais. No entanto, a ânsia de possuir algo que todos desejam leva-nos a esquecer estes valores fundamentais. A atitude de açambarcar, seja papel higiénico ou chocolate, reflete uma sociedade centrada no “eu”, onde o medo de ficar sem, supera a vontade de partilhar.
É curioso como um simples chocolate pode servir de espelho para os nossos comportamentos. A procura desenfreada por este produto levou à sua escassez nas prateleiras e à sua revenda online a preços exorbitantes, chegando aos 100 euros por uma tablete que originalmente custava 4,99€. Esta especulação revela não só a ganância de alguns, mas também a vulnerabilidade de muitos que se deixam levar pela tendência do momento.
Mas será que este chocolate é assim tão irresistível? Ou será que é a ideia de possuir algo exclusivo que nos move? Na era das redes sociais, onde tudo se partilha e tudo se compara, ter o que é raro torna-se uma forma de validação pessoal. Esquecemos que a verdadeira satisfação não está no consumo desenfreado, mas na capacidade de apreciar as pequenas coisas e, sobretudo, de as partilhar.
Este tempo quaresmal convida-nos ao jejum, não apenas de alimentos, mas também de comportamentos que nos afastam dos valores cristãos. É um tempo para refletir sobre as nossas ações e sobre como podemos contribuir para uma sociedade mais justa e solidária. A atitude de açambarcar, seja o que for, contraria este espírito de partilha e comunidade.
Talvez seja hora de repensarmos as nossas prioridades. Será que precisamos mesmo daquele chocolate que todos querem? Ou será que podemos encontrar satisfação em gestos mais simples e significativos? Afinal, a verdadeira doçura da vida não está nas coisas que possuímos, mas nos momentos que partilhamos e nas relações que cultivamos.
Que esta Quaresma nos inspire a olhar para além das tendências passageiras e a focar-nos no que realmente importa: o amor ao próximo, a partilha e a construção de uma comunidade mais unida e solidária. E da próxima vez que virmos uma prateleira vazia, que seja porque todos tiveram a oportunidade de levar um pouco, e não porque alguns levaram tudo.
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