Nem todos são chamados a ser artistas

Carlos Costa
11 Abr. 2025 4 mins
Carlos Costa

Estes dias consegui reunir – graças a uma simbiose perfeita – dois temas que há muito venho considerando: o ensino das artes no Alto Minho e a dinâmica cultural que verifico no concelho de Arcos de Valdevez.

Ora, nada mais oportuno, pois, que as notícias veiculadas ao longo dos últimos dias, que nos dão conta da construção de raiz de uma escola pública dedicada ao ensino artístico, mais concretamente ao ensino da dança, teatro e música. Este investimento, orçado em 2,1 milhões de euros, será realizado pelo Município de Arcos de Valdevez no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência e permitirá receber cerca de 400 alunos. Estará disponível para jovens estudantes do ensino articulado, mas também para a população adulta.

Um dos motivos que terá levado o município a avançar com este projeto, deve-se, segundo o mesmo, “ao aumento da procura e do interesse (…) no ensino artístico.” Com efeito, esse aumento de interesse não tem tido ao longo dos últimos anos uma resposta adequada na nossa região, que não disponibiliza as alternativas necessárias, nem ao nível do ensino básico e secundário, nem ao nível do ensino superior.

No ensino básico, a oferta é muito pequena e limita-se à formação complementar do ensino articulado; no ensino secundário (com exceção para alguns cursos profissionais ligados à Música, Artes Gráficas e Design) a oferta educativa está praticamente cingida ao ensino de Artes Visuais, nos cursos Cientifico-Humanísticos; e no ensino superior, idem, com uma oferta limitada a alguns cursos de Design e Educação Artística.

Sabemos que, de facto, para quem quer e tem vocação para ser ator, escultor ou arquiteto, por exemplo, a sua formação passará sempre por sair do Alto Minho. Sim, vocação. Acredito, tal como escreveu o Papa São João Paulo II, que “o talento artístico é a vocação que o criador atribui ao artista”. Sabendo que, tal como refere, “nem todos são chamados a ser artistas”, a sociedade deverá dar uma resposta cabal e uma oferta formativa de qualidade aos jovens que procurem seguir esta vocação.

Não sou muito velho…. mas ainda sou do tempo em que quem ia para Artes e não queria dar um desgosto aos pais, tinha de ser Arquiteto. Não foi o meu caso, mas era comum. O meu louvor, pois, ao município de Arcos de Valdevez, que percebeu a necessidade de oferecer aos jovens esta oportunidade formativa e assim, descentralizando e investindo na Cultura, formar de forma visionária e crítica as nossas próximas gerações.

De facto, como referi, o município de Arcos de Valdevez tem vindo ao longo dos últimos tempos a realizar uma série de investimentos no domínio da Cultura que têm despertado a minha atenção. Para além dos projetos transversais a todos os municípios do Alto Minho e da agenda de eventos que atrai cada vez mais visitantes ao concelho, destaco alguns dos investimentos que tenho acompanhado: a valorização e recuperação do património natural e cultural, no âmbito do projeto Território de Santa Cruz; a instalação de residências e incubadoras artísticas no âmbito da Plataforma Criativa de Arcos de Valdevez; a criação do Portal da Memória Arcuense, que guardará milhares de registos relacionados com a identidade arcuense, incluindo o do património material e imaterial; a recuperação do Cineteatro Alameda e restantes infraestruturas de apoio para galeria de arte e eventos; o reconhecimento e o trabalho desenvolvido pelo Espaço Valdevez – História e Arqueologia, na valorização do património cultural do concelho; ou, por fim, a descentralização da oferta cultural, com o trabalho e eventos desenvolvidos, por exemplo, na freguesia de Extremo, que permitiu ao longo dos últimos tempos, acolher periodicamente investigadores de Arquitetura, Arqueologia, Arte e Design, numa série de intervenções financiados pelo Município.

Fora dos grandes centros urbanos – onde tudo acontece e a oferta formativa é variada – parece-me ser este o caminho correto para promover Cultura: proporcionar, formar, preservar, promover e dinamizar, aproveitando sempre, claro está, as oportunidades de investimento que os financiamentos comunitários nos oferecem. Sem estes financiamentos, poucos destes projetos chegariam a bom porto. Entendo que, no final, será apenas e sempre uma questão de opções e prioridades.

Nem todos são chamados a ser artistas. Mas os que não são, que não seja por falta de oportunidade. Um bem-haja para a futura Escola de Artes de Arcos de Valdevez!

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