Em mar revoltado

Há algum tempo já, vivemos todos mais ou menos entre as quatro paredes da casa que habitamos todo o ano. Parece-nos que é tempo “interminável” e projetamos o que vamos fazer depois desta experiência de salutar confinamento. Enfrenta-se o perigo e tiram-se ilações.

Notícias de Viana
27 Abr. 2020 3 mins
Em mar revoltado

Pululam
iniciativas diversas, o que põe à prova a nossa capacidade de inventar
distrações e de elaborar formas de estar com aqueles que são nossos, seja por
via virtual seja por via real, (as nuvens andam sobrecarregadas, o que parece
justificar a demora do calor). Estamos envolvidos numa criação quotidiana que
implica saídas sadias para uma realidade que todos os dias parece ser a mesma,
sem grandes perspetivas de resolução. Estamos sujeitos a viver em casa, nós que
gostamos tanto de sair, de não estar isolados pelas quatros paredes da nossa
habitação. Viver em casa parece que aperta e, como diziam os nossos antigos
saídos das formaturas, “intelectus apertatus discurrit” (intelecto
apertado discorre, dizia-se em latim popular de fim de curso). Mesmo em mar
revoltado, há saídas.

A
arte sai connosco à nossa janela ou varanda e somos inovadores nas formas de
empregar o tempo com filhos e nas formas com que dizemos aos outros que os amamos.
Vamos aprendendo a conviver em espaços exíguos e a inventar formas de gestão
dos nossos parcos recursos. A veia criadora aparece agigantada em nós: a música
e os mais variados místeres ajudam-nos a passar o tempo e a estar com os outros
que nos envolvem. Parece um paradoxo real: em tempo de isolamento, estamos com
muitos de nós, o que não acontecia geralmente quando a liberdade de circulação
nos estava garantida. Apertados, criamos novidades.

– Ser sociedade

Quando
vivíamos com os outros, nos acotovelávamos e agora damos conta que sozinhos
estamos com os nossos vizinhos. Uma época de carestia traz aprendizagens novas
que desejamos que perdurem. Viver fora era o quotidiano e agora viver dentro
ensina algo para o tempo de viver fora. Atentos ao que é mais importante, sem distrações
do essencial, para que a convivência seja pacífica e jubilante em tempos de
folgada liberdade. Este tempo de tempestade revoltada aporta(rá) as suas
lições.

Os
cristãos dão-se conta da importância de estar com a comunidade dos irmãos, do
benéfico de estar juntos, do consolador da presença do outro. As assembleias
deixam de ser uma seca, para serem necessárias para a vida individual, como o
ar para os pulmões de uma sociedade. Venha de novo o tempo de apreciarmos o
estar juntos, para maior glória de Deus. As diferentes iniciativas dizem o
poder do espírito em nós e formulam votos de assembleias benéficas em tempo de
bonança e de paz.

Viver dentro para aprender a viver fora, estar dentro para aprender a estar fora, habitar a sua casa para aprender a estar com os outros e deixar que as criações não sejam atrofiadas: há no homem muitas possibilidades que se estiolam antes de ser libertadas. Estar sozinho, contido, por algum tempo vai ajudar a estar com todos de forma mais pessoal e reconhecida.

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