Liturgia nos meios digitais

No dia 1 de junho, o Secretariado Diocesano da Liturgia organizou uma tertúlia on-line com o tema “A Liturgia nos meios digitais”, que contou com a participação de D. José Cordeiro, Presidente da Comissão Episcopal de Liturgia e Espiritualidade, D. Carlos Azevedo, Delegado do Conselho Pontifício para a Cultura, João Duque, teólogo, e Eugénio Amorim, músico e compositor, com a moderação de Paulo Rocha, jornalista da Agência Ecclesia.

Notícias de Viana
10 Jun. 2021 6 mins
Liturgia nos meios digitais

D. José Cordeiro, presidente da Comissão Episcopal de Liturgia e Espiritualidade

Afirmando que a “pandemia pôs à prova a própria Liturgia e veio destacar a necessidade urgente de formação integral para a participação na liturgia”, D. José Cordeiro referiu que, num primeiro momento, ela “revelou a fragilidade dos meios e comunidades”. No entanto, salientou que a pandemia ajudou a robustecer o papel de alguns ministérios, nomeadamente o do acolhimento. 

Doutro modo, declarando que “a Liturgia reflete o que é a Igreja”, alertou para o facto de, também aí, não poder tudo, em particular no que diz respeito à criatividade que, apesar de ter sido em muitos casos positiva, deveria, em outros, ter sido mais alicerçada no conhecimento e fundamentação teológica, considerando que a Liturgia não pode ser espaço para improvisação e teatralização, levando-o a concluir, por estes mesmos motivos, pela necessidade imperiosa de não se desistir da formação litúrgica.

Com efeito, afirmou estar convicto de que “se perdemos a simbologia [litúrgica] (…) estaremos sempre a preencher vazios”, advertindo, por fim, para o facto de a natureza própria da Liturgia, não obstante a importância dos meios digitais, exigir o encontro e a presença, e “sobre o perigo desta se transformar num exercício ideológico”.

D. Carlos Azevedo, Delegado do Conselho Pontifício para a Cultura

“O fechar os espaços litúrgicos permitiu também valorizar a Igreja doméstica, redescobrindo a importância de começar em casa”, iniciou D. Carlos Azevedo, precavendo, em seguida, que “não se é cristão sem comunidade, Liturgia e Sacramentos” o que implica “presença, sinais e celebração, que se fazem com relação pessoal e não apenas virtual”. No entanto, o Delegado do Conselho Pontifício para a Cultura salientou que “há uma densidade espiritual que pode ter sido desenvolvida se alguém olhou com olhos cristão e evangélicos para a crise, porque também pode ser motivo de crescimento. O cristianismo é uma relação pessoal com Cristo que precisa de sinais e celebrações, mas se isso se revitalizou pela falta das celebrações, ótimo”. 

Assim sendo, apontando a necessidade de se aprender, em simultâneo, quer a linguagem da Liturgia, quer a linguagem do universo digital para uma celebração bem transmitida, apelou à necessidade de auto-crítica e auto-avaliação permanentes por parte dos diversos agentes de pastoral, para assim se poder avançar para formas cada vez mais exigentes. Espírito que estendeu à homilia que, sendo “também um momento celebrativo” e não um “inciso”, deve ter a capacidade para fazer ecoar a palavra no presente, de modo que “as pessoas pensem que ‘esta homilia foi feita para mim’”. 

Por último, disse que acredita que a pandemia mostrou a necessidade e a possibilidade de novos horários, na linha de maior flexibilidade das diversas propostas, revelando, ainda, que “a arte de bem celebrar é arte de bem viver”.

João Duque, teólogo

João Duque, Vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, começou a sua intervenção realçando que, neste tempo, um “aspeto positivo para a Igreja foi ter mostrado muita capacidade de reação e criatividade, nomeadamente, nos meios digitais”, deixando claro que “pode ter sido uma boa altura para pensar, porque o ser cristão não é só ir à Missa ao Domingo por rotina, o que nas nossas regiões ainda é bastante frequente e pode ter os seus problemas”.  “Acho que este interregno pode revitalizar a perceção da importância de construção de comunidade local e de aproximação à comunidade local. E pode ainda ajudar a articular a dimensão da celebração com o resto da vida que foi o que vivemos durante estes meses”, referiu de seguida.

Com efeito, expôs que as celebrações em tempo de pandemia podem ter denunciado um certo predomínio excessivo da figura do Presidente no rito latino, ao mesmo tempo que deixaram antever a Liturgia como arte total, despertando, de igual modo, a atenção para o cuidado com a luz e o espaço físico da celebração. 

Interrogado sobre o sentido da criatividade nestes contextos, João Duque afirmou que “não se trata de uma invenção pura e simples”, que não “pode ser uma criatividade subjetiva”, e que deve começar por “envolver mais a comunidade”, não estando, por isso, centrada na figura do Pároco. 

Neste sentido, focou a diferença entre “a arte da celebração que nos envolve e o espetáculo”, alertando para o perigo da celebração a esta dimensão. No entanto, na relação com o mundo digital, explicou que o tempo de pandemia ajudou, por um lado, a esclarecer que a virtualidade não resolve todos os problemas da vida humana e, por outro, a vislumbrar que não se pode já separar o mundo analógico do virtual, pela emergência de experiências cada vez mais híbridas e de nomadismo. 

Eugénio Amorim, músico e compositor

Realçando o sentimento de saudade face à experiência comunitária, considerando “a necessidade de estarmos uns com os outros”, Eugénio Amorim assegurou que “a pandemia veio tornar evidente aquilo que não estava bem” e que, inclusivamente, “aqueles que já não estavam bem, pioraram”.

Neste sentido, apelou a que se percebesse a Liturgia como obra de arte, certificando que, por um lado, “não basta transmitir a celebração”, como também “não basta o músico ser bom”, oportunidade para destacar ainda o facto de “o celebrante não ser o dono da celebração”.

Assim sendo, confessou que sente que se fala muito nas celebrações e que a pandemia só agudizou o problema, com o redobrar de textos e orações, pedindo, com efeito, “menos palavra e mais envolvência”, advertido que sente que, não raras vezes, se confunde “a preparação da Liturgia com uma prescrição” de cada momento e atuação.

Terminou, por isso, a afirmar que sente que o princípio do caminho litúrgico a percorrer é a pergunta por até onde cada comunidade anseia ir. 

Tags Religião

Em Destaque

Notícias atuais e relevantes que definem a atualidade e a nossa sociedade.

Opinião

Espaço de opinião para reflexões e debates que exploram análises e pontos de vista variados.

Explore outras categorias