Ubuntu, uma experiência que fortalece laços com os outros

As Escolas Pintor José de Brito e E. B. 2, 3 Frei Bartolomeu dos Mártires integram a Academia de Líderes Ubuntu – Escolas Ubuntu. Um programa de capacitação destinado a jovens entre os 12 e os 18 anos, desenvolvido a partir do modelo de liderança servidora e com a inspiração de figuras como Nelson Mandela, Martin Luther King ou Malala.

Micaela Barbosa
3 Mai. 2024 8 mins
Ubuntu, uma experiência que fortalece laços com os outros

Sob o mote “Eu Sou porque tu És”, o programa defende a valorização da interdependência e da solidariedade e visa “desenvolver e promover competências pessoais, sociais e cívicas dos participantes, contribuindo para a sua transformação em agentes de mudança ao serviço da comunidade, ajudando a construir uma cidade mais justa e solidária”.

O método Ubuntu aposta no desenvolvimento de cinco competências centrais, que trabalham o autoconhecimento, a autoconfiança e a resiliência, a empatia e o serviço. A empatia foi, talvez, a palavra mais ouvida durante as entrevistas. Quer por parte dos professores responsáveis pelo programa, quer dos alunos. “Aprendemos a colocar-nos no lugar do outro. Não pensar só em nós e, assim, fortalecermos laços entre nós”, contou Carlota Lopes, aluna do 11º ano da Escola Pintor José de Brito.

Juntamente com mais alguns colegas, a jovem fez também a formação Ubuntu. “Há pessoas que estão pior que nós. E, por isso, aprendemos a dar força e não julgar os outros, tentando conhecer primeiro, porque há sempre algo de bom que nos toca”, salientou, descrevendo o Clube Ubuntu como um momento entre “família e amigos”. “Os professores puxam-nos e motivam-nos para o projeto, dando continuidade ao clube”, acrescentou, revelando que a visita ao Berço, foi uma experiência “marcante” porque viu “a felicidade das crianças com tão pouco”.

Já Rodrigo Pires e Juliana Rodrigues, alunos do 9º ano, frisaram que o clube também lhes ensina “coisas novas”. “A ida ao lar de Lanheses marcou-me de forma especial. Foi muito bonito vê-los sorrir”, confidenciou Rodrigo, contando que partilharam “bons” momentos. “Sou da opinião de que mais alunos deviam fazer a formação porque, durante aquela semana, pensei em coisas que durante toda a minha vida nunca tinha pensado. Coisas que eram dadas como certo… Comecei a pensar mais em mim e nos outros que, apesar de muitas vezes se mostrarem bem, podem não estar, na verdade”, admitiu Juliana.

“Nunca dei tantos abraços na minha vida”

Marilene Esteves é professora de Espanhol e é uma das responsáveis pelo Clube Ubuntu na Escola Pintor José de Brito, que contempla cerca de 30 alunos dos 8º e 9º anos.

No plano de atividades, o projeto integra a Semana Ubuntu. Uma semana em que os alunos não têm aulas e participam em várias atividades que contam com o apoio da Junta de Freguesia de Santa Marta de Portuzelo, Viana do Castelo. “Queremos implementar o espírito de interajuda, de serem líderes e servidores da comunidade”, referiu a professora, dando nota de que desenvolveram um conjunto de atividades junto da comunidade, desde campanhas solidárias e visitas ao Centro Social da Paróquia de Santa Marta de Portuzelo, ao Berço e à Methamorphys. “Há alunos que têm baixa autoestima e conseguem melhorar essas competências. Além disso, criam laços muito fortes entre eles e com os professores também”, destacou, considerando o projeto “uma mais-valia para o futuro”.

Este ano, o clube promoveu uma atividade para integrar alunos estrangeiros, que existem “cada vez mais” nas escolas. “Fizemos o jogo do bingo humano, cujo objetivo é conhecerem-se. Os alunos tinham de falar uns com os outros”, recordou, reforçando que o projeto “tem tudo para contribuir para a melhoria na relação entre as pessoas”. “Infelizmente, acabou o financiamento. Não tivemos a possibilidade de promover formações para os professores e com outros alunos, o que seria uma mais-valia para todos”, considerou, reconhecendo a colaboração dos pais. “Sem o apoio deles, nem todos conseguiam participar”, salientou.

O Clube Ubuntu funciona uma vez por semana durante 90 minutos e, para o futuro, pretende promover mais campanhas solidárias e trazer, outra vez, os idosos do Centro Social da Paróquia de Santa Marta de Portuzelo à escola. “A semana Ubuntu é uma semana de muitos afetos. É mesmo diferente. Nunca dei tantos abraços na vida como naquela semana. Há muita introspeção. As atividades estão muito bem pensadas, até a música e o tempo”, frisou.

Uma outra professora responsável é a professora Céu Vilela, de Educação Moral e Religiosa Católica. “Naquela semana, eles foram capazes de, em determinados momentos, olhar para dentro, conhecerem-se melhor e refletir sobre situações que davam como adquiridas. No final, aperceberam-se que têm fragilidades, medos e questões. Conseguiram falar sobre isso, abrindo o coração, mostrando os seus medos e o que os faz sentir pior na vida. Vivemos momentos intensos”, confidenciou, frisando que são essas experiências que levam aos outros. “Levam as emoções às várias instituições, mostrando que eles não estão sozinhos e que, por exemplo, num Lar, podem ter relação com os jovens”, acrescentou, frisando: “Eles deram de si, mas ganharam muito.”

“O clube permite que criem laços entre eles e os professores” fora da sala de aula

Na E. B. 2, 3 Frei Bartolomeu dos Mártires, o projeto conta com a coordenação da professora Paula Pinto, de Educação Visual. “O diretor inscreveu a escola no projeto”, contou, confidenciando que vê a escola como “uma forma preventiva” e, por isso, convidou os alunos (7º, 9º e 11º anos), do ensino regular e profissional, a “estar na escola de outra maneira”. “Abrimos o leque dos alunos para manter o projeto ativo e, hoje, são cerca de 30 alunos assíduos”, acrescentou.

Aqui também formaram o Clube Ubuntu, que se divide entre a E. B. 2, 3 Frei Bartolomeu dos Mártires e a Escola Secundária de Santa Maria Maior. São 45 minutos em cada lado. “Este ano, começámos com uma atividade de acolhimento aos 10os anos, realizámos ações nas salas de aula, participámos nas campanhas do Banco Alimentar, realizámos cabazes solidários e já fomos fazer surf no Cabedelo”, enumerou, especificando: “Estamos agora a realizar uma ação para alertar para a higiene nas casas de banho. Eles acharam que não estavam a ser bem cuidadas e decidiram fazer uns cartazes para chamar a atenção.”

Para o futuro, o clube está a preparar um mercado de roupa. “Ainda não está a funcionar, mas já temos algum material”, revelou, explicando que “vai existir uma moeda própria”. “As pessoas entregam a roupa, é avaliada, recebe moeda e troca por roupa”, acrescentou.

A professora responsável garantiu que os alunos estão “muito envolvidos” e “presentes” nas atividades “porque se apercebem de que a escola não é só um estabelecimento académico”. “O clube permite que criem laços entre eles e os professores, percebendo as diferenças entre o contexto sala de aula e o de fora dela. Há uma proximidade, e descobrimos coisas uns dos outros de que, em sala de aula, não nos apercebemos”, referiu, contando que “os alunos mais novos andam, muitas vezes, pelos corredores, nas cavalitas dos mais velhos”. “Dão-se muito bem e ajudam-se mutuamente”, salientou.

O objetivo é dar continuidade ao projeto Ubuntu “caso a direção assim o entenda”. “A escola, por vezes, fomenta a competição pouco saudável e o que a gente espera é que estes jovens entrem na competição, mas de forma saudável. Não temos de ser todos amigos, mas saber trabalhar uns com os outros”, sublinhou, destacando a resiliência como uma das competências que adquirem. “Eles perceberem que não conseguem fazer coisas hoje, mas, se forem resilientes, conseguem amanhã. E, aprendem a aceitar os outros e aos próprios como são”, especificou.

Paula Pinto destacou, ainda, que os alunos têm iniciativa e organizam-se para cumprir os seus compromissos. “Há uma preocupação em conseguir gerir tudo porque, muitos deles, têm outras atividades”, disse, revelando que já há alunos interessados em participar no projeto.

Cândida Sousa é professora de Educação Moral e Religiosa Católica e também faz parte da coordenação. “Eles aprendem a conhecer-se e a ajudar-se uns aos outros”, reforçou, considerando que, hoje, “é cada vez mais necessário que os jovens sejam resilientes, porque o mundo muda muito rapidamente”. “Eles vivem experiências diferentes, que os enriquecem para o futuro”, afirmou, falando de outras competências como a empatia e o serviço. “O projeto debruça-se numa ética do cuidar de si e dos outros”, acrescentou.

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