José Pita: “Temos de ser a referência em tudo aquilo que melhor temos para oferecer aos outros”

Foi no rescaldo do XXV Congresso Nacional da JP (Juventude Popular), que o Notícias de Viana entrevistou José Pita. Uma semana antes de terminar o seu mandato enquanto presidente da JP de Ponte de Lima, do qual afirmou estar “satisfeito” pelo trabalho desenvolvido a nível social, solidário e partidário, a temática da habitação foi um dos temas centrais da conversa.

João Basto
2 Jun. 2023 10 mins
José Pita: “Temos de ser a referência em tudo aquilo que melhor temos para oferecer aos outros”

Notícias de Viana (NdV): Que balanço faz do seu mandato?José Pita (JP): Foi um mandato de continuidade. Nós tivemos um slogan no mandato anterior, quando era vice-presidente, que era “Voltar a acreditar”. O objetivo foi reestruturar a JP, reerguer a militância e tentar atrair mais jovens para a própria instituição.

Quando assumi a presidência, foi com este slogan de continuidade, mas, embora fosse presidente, trabalhámos muito em conjunto e conseguimos passar de nenhuma representatividade nos órgãos de Ponte de Lima, para um momento em que quatro membros da Assembleia Municipal são da JP.

(NdV): E como é que essa representatividade se traduz em medidas concretas para o concelho?(JP): Ponte de Lima é governada por uma maioria CDS e, desde há muito tempo, a JP tem relações estreitas de debate e contributo. Antes de avançar com o apoio à candidatura do Eng. Vasco Ferraz, que ganhou a Câmara Municipal, criámos um grupo de propostas que quisemos entregar e considerar ser os desígnios da JP, ligados à educação, à habitação, à juventude e ao ambiente. No entanto, o objetivo dos membros da JP que estão na Assembleia, é trazer esses temas à tona. Claro, não quer dizer que sejam elevadas as propostas por parte da nossa bancada, mas estão sempre em debate. Algumas delas estão a ser formuladas para serem apresentadas ainda neste mandato.

(NdV): Mas pode concretizar alguma destas propostas?(JP): Estamos a trabalhar em duas que não quero revelar, porque não foram ainda sequer levadas à reunião de Câmara.

(NdV): Do que pode revelar, quais as áreas em que é mesmo preciso intervir?(JP): Na área do desporto, por exemplo, achamos que há algo mais que se pode fazer, nomeadamente, no contacto interassociativo, para que, de forma mais trabalhada e mais contínua, possam surgir eventos que envolvam as associações que já existem e para que sejam aproveitadas as infraestruturas que já foram construídas. Neste momento, em Ponte Lima, temos uma elevada área útil de espaços desportivos por habitante, mas temos de nos servir dela, e servir dela não apenas através do associativismo, mas abrangendo a sociedade civil. Acreditamos, também, que apesar de estar a ser feito um bom trabalho no plano cultural, aos poucos devem surgir, e achamos que é o que estão a fazer, mais eventos culturais que atraiam a comunidade mais jovem.

(NdV): E acha que isso vai ajudar a que eles se fixem em Ponte de Lima?(JP): Nesta fase, há uma necessidade de localidades, como Ponte de Lima, apoiarem os seus jovens, de forma a contornar o inverno demográfico que estamos a enfrentar, fomentando a qualidade de vida …

(NdV): Mas há quem reconheça que Ponte de Lima é um bom lugar para viver a reforma e investir as poupanças, e não para investir nos jovens.(JP): Mas há vários projetos, não só para habitação jovem, que têm sido uma das bandeiras defendidas, através de projetos para habitação jovem com renda acessível e que estão a ser desenvolvidos também nas aldeias. Muitas vezes, não no centro da vila, porque sendo vila turística, é complicado implementar esse tipo de projetos lá. Mas eu sei que um dos objetivos deste Executivo é criar condições para que jovens lá fiquem.

(NdV): Num texto recente, o líder da JP afirmou que “o problema dos preços da habitação não é o dinheiro ou o investimento estrangeiro”. Consegue explicar? Afinal, qual é o problema da habitação?(JP): O problema da habitação é termos um Estado sem programa, que resolve os problemas em cima do joelho e não quando eles começam a surgir. Não se justifica um pacote para habitação apresentado pelo Governo, em que ninguém se identifica com a maioria das medidas que foram tomadas. Por que não isentar um jovem do IMT (Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis) ou do imposto de selo? É um impacte assim tão grande para o Governo isentar um jovem que quer a sua primeira habitação desses dois impostos? Para um jovem faz toda a diferença no seu início de vida. Por isso, o problema da habitação não está no investimento estrangeiro, mas em tomar medidas que possam apoiar quem quer criar a sua primeira habitação, em que, de uma sociedade de arrendatários, possamos passar a uma sociedade de proprietários. É verdade que estamos a enfrentar o dilema das rendas inacessíveis, mas o grande problema não é esse. Nós temos de, a longo prazo, tornar estes jovens proprietários, e temos de promover a aquisição da primeira habitação. E isso não tem nada a ver com o investimento estrangeiro, que está focado no turismo.

(NdV): Porque acha que o CDS tem mantido a Câmara de Ponte de Lima durante tanto tempo?(JP): O CDS tem uma excelente estrutura de militantes e, em Ponte de Lima, o CDS sempre foi marcado por defender as suas gentes. O CDS, ou quem o representava.

(NdV): Mas não é possível ver esta manutenção na presidência de Câmara, como um exemplo da “máquina” do CDS?(JP): Vai-se sempre falar da máquina do CDS, ou do PS, ou do PSD – como se diz em Arcos de Valdevez – porque, normalmente, estes são partidos que, nestas localidades, devido à sua perseverança e ao trabalho que têm realizado, têm uma boa base de militantes e de apoiantes. Acho que é inegável que Ponte de Lima está num excelente caminho há muitos anos.

(NdV): Mas, nas mais recentes eleições, aumentaram os conflitos internos. Não podiam ter perdido a Câmara?(JP): Honestamente, não, porque, embora houvesse duas listas com ex-elementos do CDS, nos focámos no caminho que queríamos traçar, nas ideias que queríamos apresentar e no que queríamos alterar. Claro que, ao fim de 12 anos, mudar de cara é importante e ajuda neste processo.

(NdV): Mudar de cara não é pouco?(JP): Mas nós temos de olhar para projetos. Porque quatro anos é insuficiente para implementar ideias. Agora, se tivermos uma linha de pensamento definida e baseada em pilares, pode alterar a cara, mas a estratégia e os fundamentos estão lá, e isso é positivo para a estabilidade e a confiança. Uma opinião pessoal: não gosto de grandes surpresas. Prefiro saber com o que contar, porque isso me traz conforto e confiança.

(NdV): E então, qual é o problema do apelo à estabilidade do PS?(JP): O problema da estabilidade do PS é que já vimos que não houve estabilidade nenhuma. É inegável que quando olhamos para um Governo que tem maioria absoluta, que pode efetivamente aplicar as estratégias que defendeu, mas não o consegue fazer de forma segura, isso traz desconfiança. Nem sempre quer dizer que a culpa seja de uma pessoa, mas é certamente do grupo de trabalho.

(NdV): No último congresso da JP, Nuno Melo afirmou que “a direita conservadora é institucional mesmo quando discorda, não pateia quando está na frente de chefes de Estado. A direita conservadora não cerca as sedes dos outros partidos”. Mas em 2021, ficou famosa uma ação da JP que exibiu, em frente à casa de José Sócrates, cartazes que diziam “A decência não prescreve”. Não há aqui uma incoerência?(JP): Não foi um cerco.

(NdV): Mas não é um chefe de Estado. É um cidadão, na sua casa particular.(JP): Mas não foi um cerco. Foi uma manifestação. Nem todas as manifestações são cercos.

(NdV): Mas não acha que é uma postura pouco institucional?(JP): Não. A JP já foi cercada e não foi uma boa experiência. Quando o Nuno Melo diz que não somos a direita que pateia é porque o CDS, apesar de, neste momento, não estar na Assembleia da República, sempre foi lembrado por ter uma postura organizada e institucional quando lá estava. Não somos de levantar cartazes a dizer “Ladrão bom é ladrão na prisão” e nem de bater na mesa quando vem um chefe de Estado com quem nós não concordamos, porque nós temos os nossos valores e um deles é respeitar também os valores dos outros.

(NdV): O que falta ao CDS para continuar na Assembleia da República? De quem é a culpa?(JP): Não podemos pôr a culpa nas pessoas. Talvez a culpa também tenha sido nossa por não ter conseguido passar a mensagem de outra forma. Falta-nos passar a mensagem. Falta-nos trazer quadros que as pessoas voltem a reconhecer como competentes para os representar.

(NdV): Uma publicação da JP enuncia esta pergunta: “Refugiados, um risco ou uma oportunidade? Consegue responder a esta pergunta?”(JP): Apesar da política internacional não ser o meu forte, acho que a União Europeia não estava preparada para a vaga de refugiados que enfrentou. Não devemos fechar as portas, porque somos uma sociedade de emigrantes. Mas tem de haver um cuidado e um clima de segurança que permitam dar condições e permitir um contexto de segurança a quem cá está.

(NdV): Na moção estratégica global, está escrito que “os portugueses vivem no mundo real e não no mundo da propaganda socialista”. Em que mundo vive o CDS?(JP): O CDS vive no mundo que idealiza o melhor para todos os portugueses e para todos os limianos e isso representa-se através do trabalho. Um dos slogans do CDS nos anos 90 no Alto-Minho, é “A nossa única promessa é trabalhar”, porque acreditamos que a meritocracia deve existir e deve ser recompensada. Somos contra políticas que premeiam aqueles que não querem fazer nada.

(NdV): Mas estamos a falar de quem, em concreto?(JP): Estamos a falar de quando mantemos pessoas através de cheques vales ou através de subsídios exagerados. Há momentos em que é necessário manter o Estado social e é preciso subsidiar, mas quando nós falamos que o último cheque-vale abrangeu cerca de três milhões de pessoas, isso é considerar que temos 30% dos portugueses carenciados.

(NdV): Regressando ao Alto-Minho, onde é preciso investir para esse mundo melhor?(JP): Em primeiro lugar, há a questão das acessibilidades e dos transportes públicos, melhorando a rede e ligando com mais fluidez os diversos concelhos. Para os municípios mais isolados e desprotegidos, uma boa rede de transportes é importante, em especial onde as pessoas só conseguem vir uma vez ao centro por semana para tratar dos seus assuntos. A nível da educação, acho que devemos fazer uma aposta na educação mais focada no tecido empresarial. Temos de ser a referência em tudo aquilo que melhor temos para oferecer aos outros. Mas devemos, ainda, valorizar mais o território no seu conjunto.

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