Augusto Silva: “O principal problema do nosso país, e a região não foge à regra, é o salário mínimo nacional”

A União dos Sindicatos de Viana do Castelo é uma organização sindical que representa os interesses dos trabalhadores na região, através de atividades, negociações coletivas, lutas por melhores condições de trabalho e outras questões laborais. Faz parte da Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses - Intersindical Nacional (CGTP) que, em fevereiro, através da sua líder, Isabel Camarinha, registou mais de 110 mil novas sindicalizações, o que é “fruto da ação e intervenção” dos sindicatos nos locais de trabalho, nomeadamente, naqueles em que os sindicalistas passaram a poder exercer plenamente a atividade sindical.

Micaela Barbosa
19 Abr. 2024 9 mins
Augusto Silva: “O principal problema do nosso país, e a região não foge à regra, é o salário mínimo nacional”

Hoje, continua-se a defender os trabalhadores, mas ainda “há um caminho a percorrer”, mais concretamente, com os trabalhadores precários, uma nova realidade que é cada vez em maior número. Em 2021, a Renascença divulgou alguns dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), indicando que “até meio deste ano, quase oito em cada dez novos trabalhadores contratados são precários”. “Ou seja, dos 384,9 mil vínculos assinados entre empregador e trabalhador neste período, mais de 293 mil são contratos ‘com termo’ ou ‘contratos de prestação de serviço’”, refere.

“Apesar de se assumir a ideia de que o movimento sindical está fragilizado, a maioria dos trabalhadores precários está sindicalizada. Só fazem desconto direto para o sector”, assegurou o coordenador da União de Sindicatos, Augusto Silva, acrescentando que as ações de luta não são tão expressivas como no tempo da troika, porque “foram cortes e mais cortes”. “As classes sociais foram afetadas porque viram alguns dos direitos já conquistados postos em causa”, considerou, frisando que, apesar da consciência de classe não ser como antigamente, “há consciência de justiça pelo trabalho muito apurada”. “Se os trabalhadores já estão precários, nem é só o receio de como as coisas são montadas, é mesmo a questão salarial. Não falo de um dia de greve ou de uma hora para uma consulta. Hoje, qualquer hora faz muita falta”, apontou, exemplificando: “Nessa altura, com a quota sindical, tínhamos trabalhadores que, independentemente de o valor ser simbólico, fazia-lhes falta.”

Augusto Silva é coordenador da União de Sindicatos de Viana do Castelo há seis anos e é, também, presidente da Junta de Freguesia de Darque. Há quem defenda que, em Portugal, a atividade sindical está partidariamente marcada. Uma ideia a que o coordenador não foge, mas que “está exageradamente conectada”. “Em reuniões para preparar as comemorações do 25 de Abril, em Viana do Castelo, houve quem comentasse que só estavam ali comunistas. E respondi: ‘Porque será? Foram convocadas 400 e tal associações e movimentos. São os que trabalham e estão disponíveis. É quem realmente sente a causa.’”, contou, justificando que são “mais disponíveis” que os jovens, porque “têm maior dificuldade em estar mais tempo no movimento associativo, em que muita parte da discussão e conversa não existe”. “Não são sempre as mesmas pessoas a assumir cargos nos sindicatos?”, insistimos. “Quem vem para aqui, ganha experiência e, se realmente for possível conciliar isso com a sua atividade profissional, é óbvio que, depois dos congressos, em que somos eleitos, se o coletivo achar que o trabalho é positivo, elegem. No entanto, nem sempre é assim”, salientou, considerando que esta realidade “acontece mais nos sindicatos e não nas Uniões”.

Regressando ao perfil de quem procura os sindicatos, o coordenador garante que as pessoas não recorrem ao movimento quando estão mais aflitas.

Na mesma notícia da Renascença, a dirigente do Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal (CESP), Célia Lopes, afirmou que “a precariedade começa a ser muito transversal; se, há uns anos, era muito frequente ouvirmos falar nela para a entrada no mercado de trabalho, ou seja, para os jovens até aos 30/35 anos, neste momento, é bastante transversal”. Augusto Silva subscreve esta realidade em Viana do Castelo, dando nota de que há também cada vez mais jovens a recorrer, “embora não estejam muito tempo no mesmo local de trabalho devido à precariedade e pelo receio das entidades patronais”. “Jovens, com contratos estáveis e com empresas estruturadas, dão esse passo. No ano passado, aumentámos o número de representantes para a Segurança e Saúde no Trabalho. As empresas reconhecem que é importante ter. Portanto, não hostilizam. Pelo contrário”, afirmou, contando que a União de Sindicatos dá formação aos trabalhadores e “eles não têm de pagar nada”.

O coordenador revelou ainda que “as pessoas não sentem que o seu trabalho é reconhecido”, defendendo que “é preciso equilibrar a balança porque, se depois não houver motivação, vai cumprir com o seu trabalho, mas com mínimos, e não é isto que se quer”. “Quando o movimento sindical é apelidado de defender tudo. Não. Nós defendemos os trabalhadores. Quem quer trabalhar”, reforçou. “Isso corresponde, necessariamente, a defender os mais pobres?”, questionámos. “Não só. Além de alguma contratação coletiva, temos o exemplo dos professores e dos médicos”, respondeu, criticando a política nacional e local. “Eles não reivindicam só a questão salarial. Colocamos os nossos filhos a estudar nas melhores escolas, mas chegam aos hospitais públicos e é o que é. Não houve investimentos”, atirou, argumentando: “Há questões políticas por detrás do dito desinvestimento e é óbvio que, depois, surgem as propostas em que um jovem, que estudou no público, tem de dar anos ao público. Poderia ser visto com bons olhos se a pessoa saísse da sua formação e tivesse boas condições. Faz-se em alguns países em que não pagam nada, mas depois têm os melhores serviços e hospitais. Aqui não é por isso que fogem.”

Em Viana do Castelo, a União de Sindicatos integra o Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, Empresas Públicas, Concessionárias e Afins, administração local (STAL), que está em Vila Praia de Âncora; o Sindicato dos Professores do Norte e o Sindicato da Função Pública do Norte; e o Sindicato dos Trabalhadores do Comércio, Escritórios e Serviços, que abrange a área do comércio e social (IPSS e Misericórdias). “Esta última é uma área que tem sido muito falada na comunicação social porque, na pandemia, juntamente com os médicos e enfermeiros, eram os heróis. Hoje, estão com esses problemas todos que vemos”, disse, defendendo que “a área social é um sector que não pode fechar”. “Trabalham de segunda a segunda. E, em termos de carreira e salários, acabou, tal como a maioria. O principal problema do nosso país, e a região não foge à regra, é o salário mínimo nacional, que consideramos o seu aumento, embora achemos insuficiente, mas que tem absorvido todas as questões das carreiras que têm existido e das outras categorias profissionais”, disse.

Um outro problema, segundo Augusto Silva, é a questão das doenças profissionais e a marcação de férias. “Estiveram em períodos de baixa ou ausentes, e a empresa diz que não sabe o número de dias a que têm direito ou, unilateralmente, decidem: é aqui, aqui e aqui. Sabemos que quem tem família, tenta conciliar pelo menos uma semana. Sabemos que há casos em que não dá porque as empresas param, mas, quando não é assim, as empresas decidem”, especificou, admitindo que há pessoas que pedem ajuda e não estão sindicalizadas.

Ainda assim, “a maior dificuldade são os instrumentos que as entidades patronais foram utilizando, um pouco contra o nosso princípio sindical, que são os prémios para isto e para aquilo”. “Todos eles afetados, pelo absentismo e etc., acabam por ter ali as pessoas quase aprisionadas. Não somos contra qualquer tipo de prémio, mas deve-se discutir com os trabalhadores para cada um saber as regras e não ser discricionário”, considerou, reconhecendo que a situação se agrava também nos despedimentos. “Querem perceber e saber se as contas estão certas”, especificou, referindo que “há uma procura diária” pelo movimento sindical. Curiosamente, mais mulheres. “Estamos numa fase, não sendo preocupante ainda, mas que tem sido quase semanal: são as pequenas fábricas têxteis. Antes acontecia nas férias, agora saem da fábrica à sexta e, na segunda-feira, não têm máquinas. Não são números alarmantes”, exemplificou, acrescentando: “E, depois, o flagelo nas mulheres que são velhas para trabalhar e novas para reformar. Têm direito ao desemprego, que é menos do que ganhavam na empresa, mas vêem-se numa situação complicada até se reformarem.” exemplificou, assumindo que a discriminação “ainda existe”.

Mais recentemente, fala-se da luta das mulheres pela igualdade. Em março, a Eco noticiou que “na Europa há mais homens do que mulheres empregadas e elas ganham menos”, especificando que “Portugal regista uma disparidade salarial de 11,9%, isto é, abaixo da média da UE de 12,7%”. Em Viana do Castelo, não se foge à regra. E, no que diz respeito à procura de ajuda sindical, são mais mulheres que homens. “A igualdade é uma coisa pela qual lutamos, mas, nestas unidades industriais, por exemplo, apercebemo-nos que não é só o facto de as mulheres, muitas vezes, não avançarem na carreira, mas também é imposto trabalho igual com salário diferente. Hoje, ainda encontramos”, lamentou, confidenciando: “Até no subsídio de alimentação já encontrámos diferenças entre homens e mulheres. Isso entristece-nos. Não se percebe.”

Por outro lado, os dados demonstram que as mulheres procuram defender os seus direitos. “Isso reflete-se, por exemplo, na eleição dos delegados sindicais. Já se nota, embora em menor número devido à questão que ainda continua cultural no nosso país: o pós-período laboral. As tarefas continuam a ser devidas às mulheres. O movimento sindical não vive só dos delegados e dirigentes no trabalho, mas depois há uma militância com as atividades que temos. Isso dificulta, notando-se as diferenças”, apontou.

Por fim, Augusto Silva considerou que “o Governo tem de fazer mais”. “A questão é que, hoje, as leis não são assim tão rígidas como se tenta passar, para despedir. Se não passarem para o quadro, o bónus, quem o tem são as empresas de trabalho temporário, mas não se justifica. Não é só a questão da precariedade como a questão do trabalho em laboração contínua. Há muitos sectores onde não se justifica, principalmente, o turno da noite”, disse, terminando: “Muitas vezes, não compensam o esforço. Pagam das 22h00 às 06h00 da manhã o trabalho noturno, e não pagam subsídios de turno. São estas questões que nós dizemos que não seriam obrigadas, mas teriam de pedir uma autorização especial, avaliando lucros ao final do ano e dividir mais um bocado com os trabalhadores. Não é para que a empresa perca lucro, porque não queremos que a empresa feche.”

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