Com 66 anos, João Chavarria é uma das centenas de pessoas que estão envolvidas na confeção dos tapetes de sal. Uma tradição com mais de 50 anos em Viana do Castelo, mais concretamente, na Romaria em honra de Nossa Senhora d’Agonia, que tem sido promovida além-fronteiras. O objetivo é tornar-se Património Imaterial da Humanidade.
Nasceu em Luanda (Angola) mas é mais vianense, porque veio viver para a Ribeira, terra dos seus pais, desde jovem.
Aos 18 anos, começou a fazer parte do grupo que confeciona os tapetes de sal e, desde então, tem representado a arte efémera pelo país e fora dele. “Inicialmente, usámos as redes dos pescadores e apetrechos ligados ao mar e, depois, apareceram as flores e o serrim. Mas todos estes materiais eram difíceis de arranjar, as flores começaram a ficar caras e, além disso, era um material que o vento facilmente ‘destruía’. Daí surgir o sal. É um material mais pesado, proporciona a cor que queremos, e mantém a ligação ao mar”, explicou, enaltecendo a forma como foi recebido e acolhido na Ribeira. “É um trabalho de equipa. Não faz sentido que seja de outra forma”, disse.
Este ano, os tapetes foram confecionados com cerca de 34 toneladas de sal e contaram com a participação de cerca de 200 pessoas, entre as quais, crianças. “Este trabalho é 100% voluntário e espero que assim continue, para que não se perca a sua essência. É preciso que as pessoas façam os tapetes com gosto, com algum nível e com algum brio”, defendeu João Chavarria, confidenciando que, no final, houve pessoas que levaram o sal utilizado em garrafas de água. “Tivemos crianças com seis anos a participar na Noite dos Tapetes. Expliquei aos pais e avós que era uma noite excecional e pedi-lhes que os deixassem aproveitar, porque marcaria as suas vidas. Prova disso é que já há crianças a pedir aos pais, avós e outros familiares, para não se esquecerem deles para o ano. Eles querem repetir a experiência”, salientou, recordando os seus filhos, que também o acompanham desde pequenos. “Aliás, tenho pessoas que começaram de crianças e, hoje, são adultos. Começam a namorar e trazem os seus companheiros e, mais tarde, os seus filhos”, acrescentou.
Segundo João Chavarria, a logística é da responsabilidade da VianaFestas através do polo de Monserrate da União de Freguesias de Viana do Castelo. “A confeção dos tapetes contempla meses e meses de trabalho. Há um projeto pré-definido e, posteriormente, fazem-se os moldes e pinta-se o sal, que é o material que utilizamos, embora haja uma ou outra rua que use flores para alguns apontamentos”, referiu, garantindo que é uma arte que está assegurada pelos jovens. “Ao arrastar os jovens, chegam ideias novas e não corremos o risco de cair na banalidade”, afirma, exemplificando: “Um dos tapetes foi sobre a louça. Foi um tapete fora da caixa porque não foi executado em linhas retas. Transmitimos a ideia de que os pratos acabaram por ser libertados na rua.”
Os tapetes de sal são uma marca na Romaria em honra de Nossa Senhora d’Agonia. Acompanhou os tempos e, hoje, é conhecida além-fronteiras. “O ano passado fomos a Aveiro participar num evento e, este ano, fomos a Lisboa, a propósito da Jornada Mundial da Juventude, e a Barcelona, no âmbito do Congresso Internacional de Arte Efémera”, enumerou, confidenciando que ficou surpreendido com o que viu em Espanha. “Nesta conferência, percebemos como, também lá fora, valorizam a nossa arte popular da confeção dos Tapetes de Sal, integrada na Romaria d’Agonia. Surpreendentemente, já muitos dos presentes conheciam os nossos tapetes de sal”, disse, acrescentando: “Sentimos que Viana do Castelo e a Ribeira estão no mapa da arte popular. Aqui, defendem o que também nós sempre defendemos, que esta arte deve ser mantida pelas pessoas de forma voluntária e por amor à camisola, pois só assim fará sentido, e só assim se poderá garantir a continuidade da tradição. Estamos orgulhosos em nome de Viana do Castelo por sermos reconhecidos num local onde estão representadas artes dos quatro cantos do mundo”.
O objetivo foi promover a candidatura à UNESCO. “As portas que se abrem dizem respeito à UNESCO, através da candidatura desta arte efémera a Património Imaterial da Humanidade. Se se concretizar terá, certamente, um impacto muito grande”, frisou.
Para o futuro, João Chavarria fala ainda da possibilidade de intercâmbio. “O ano passado, tivemos vizinhos de Vigo a assistir à noite dos tapetes. A ideia é irmos lá fazer um apontamento ou outro e eles virem cá fazer o mesmo. São iniciativas de partilha da cultura através da arte”, concluiu.
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