Porque gostamos de nos ver representados? Porque gostamos que falem de nós e dos nossos? Que contem a nossa história ou simplesmente que nos “pisquem o olho”, mostrando que existimos? Talvez porque isso nos identifica e aproxima do real, dando-nos valor e existência perante os outros.
Gostamos que contem as histórias daquela que consideramos ser a nossa comunidade, e temos dificuldade a resistir quando a história que nos contam sobre a nossa comunidade é elogiosa e nos faz sentir elevados. Afinal, não é assim desde tempos remotos, com os cronistas de todos os reinos, sempre contratados para glorificar os feitos da sua comunidade, a começar, claro está, pelo seu rei?
A pertença é uma necessidade intrínseca do ser humano e nada há de errado nela. Impulsiona a autoestima e a autoaceitação, permitindo que cada pessoa se veja refletida e validada na sociedade. Por isso, nos dias de hoje, a questão da representatividade é tão importante.
Como destaca a escritora e ativista Audre Lorde, “representatividade é o reconhecimento de que cada indivíduo, independentemente de sua origem, gênero, raça, orientação sexual ou habilidades, tem o direito de se expressar, ser ouvido e representado”. E de que forma é que a representação, o ver-se representado, pode ser importante? Exemplifico com uma história recente que testemunhei no átrio do Teatro Municipal Sá de Miranda, em Viana do Castelo: no espetáculo “Nada Mais Bonito”, a certa altura da peça, uma personagem diz que no Brasil brincava nas poças de água porque chovia pouco e estava sempre calor e que, depois de ter vindo para Portugal não o fazia, até porque se o fizesse podia ficar gelado.
Depois do espetáculo terminar, os 4 atores, três homens e uma mulher, estavam no átrio do teatro ainda com as roupas do espetáculo e interagiam com o público, tirando fotografias. Habitualmente, as crianças correm todas para abraçar a atriz, protagonista na peça. Mas naquele dia, uma menina desceu do colo do pai e correu a abraçar o ator que interpretava a personagem brasileira e quis tirar a sua fotografia ao colo dele.
Todo o elenco e demais presentes ficaram surpreendidas, até que ouviram os pais da menina falar, percebendo então que eram brasileiros. Provavelmente, aquela menina, que falava com sotaque e que não tinha mais de cinco anos, terá também vindo do Brasil para Portugal e já terá memória disso.
Foi evidente que o que motivou aquele abraço foi a identificação da menina com a personagem. Aquele momento despertou todos os presentes, através de um exemplo ao vivo e tão puro quanto o de uma criança pode ser, que a representatividade é de facto muito importante e que valorizá-la é também uma forma de compreender a verdadeira essência da democracia.
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