Viana do Castelo e Vila Nova de Cerveira destacam-se nas exportações a Norte. Qual o seu impacto na economia local? 

De acordo com os dados de crescimento das exportações registadas, publicados no relatório do primeiro trimestre de 2024, divulgado pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, Viana do Castelo foi o concelho com maior crescimento das exportações entre os 86 municípios da região Norte. Já Vila Nova de Cerveira lidera as exportações, na indústria da construção naval, com uma participação de 87,2% no total da fileira, passando de 69 milhões exportados, em 2019, para 123 milhões de euros, em 2023.

Micaela Barbosa
4 Out. 2024 8 mins

Entre 2011 e 2021, as Estatísticas Nacionais mostraram que as exportações aumentaram 66,3%, no Alto Minho, tendo alcançado, em 2021, o valor de 1,9 mil M€, representativo de 8,2% das exportações do continente e da região norte. Nesta mesma região, e no mesmo período, o aumento das exportações foi de 45%. A taxa de cobertura das Importações (que determina a capacidade de cobrir o valor das importações) foi em 2021 de 139%, versus 116 % da região norte. 

Com o contributo das exportações, segundo José Escaleira, doutor em Economia e professor aposentado do Instituto Politécnico de Viana do Castelo, o Alto Minho gerou, em 2020, um valor acrescentado bruto de 1,6 mil M€, tendo crescido entre 2011 e 2020 59%, representando 5,5% da região norte e 1,7% do continente. “Foi a indústria transformadora, setor fortemente exportador, que mais contribuiu para o VAB do território (cerca de 41%)”, indicou, acrescentando que “as empresas aumentaram, no Alto Minho, em 2020, em 41% face a 2011, representando 6,5% da região norte e 2,2% do continente”. 

No Alto Minho, as empresas mais exportadoras repartem-se em 35 em Viana do Castelo, 14 em Vila Nova de Cerveira e 12 em Ponte de Lima, com 23% dos trabalhadores pertencem a empresas de capital estrangeiro, criando 37 % do valor acrescentado bruto.

Em relação aos dados mais recentes, que destacam o concelho de Viana do Castelo, o economista reconhece que a capital do Alto Minho é “capaz de atrair empresas, empresários e recursos humanos que favorecem o desenvolvimento de empresas exportadoras”. “A criação de parques industriais e a dinâmica no aproveitamento dos recursos marítimos e aquáticos tem permitido a Viana do Castelo ser um concelho com dinamismo empresarial, embora com empresas que não são de matriz local, com todas as desvantagens a isso associadas”, justificou, dando nota que, em termos de exportações, Viana do Castelo pertence ao grupo de cinco municípios que, em 2021, no Norte, concentraram as exportações da fileira florestal (no caso de Viana do Castelo – pasta e papel), tendo sido responsáveis por 75,3% do total das exportações (Viana do Castelo com 249 M€), e da fileira dos metais comuns (ferro fundido, aço e alumínio, com baixa tecnologia) e nos produtos da fileira das máquinas, aparelhos e material elétrico. “A fileira dos peixes, crustáceos e moluscos também desempenha um papel relevante nas exportações das empresas de Viana do Castelo, posicionando-se nos 5 principais exportadores”, acrescenta.

O concelho de Viana do Castelo também se encontra, em termos tecnológicos, no grupo dos responsáveis por 10,1% do total das exportações de alta tecnologia do Norte. “Estas indústrias são mais intensivas em conhecimento e em mão-de-obra qualificada, implicando   maiores custos de investimento, de inovação, e de formação, o que exige empresas de maior dimensão e subsequentemente, maior concentração empresarial e territorial”, considera, destacando alguns fatores que contribuíram para estes resultados desde a posse de “indústrias transformadoras (construção naval, celulose, produtos metálicos, etc.) e ter sido capital de distrito, detendo por isso um capital de recursos naturais, humanos e de infraestruturas materiais de transportes, de saúde, de educação, de turismo e lazer e outras, para além da sua localização geográfica privilegiada, entre portos e na rota do Atlântico; a existência de recursos humanos e naturais passíveis de ser utilizados na economia, nomeadamente, a partir da existência de instituições de ensino superior com cursos tecnológicos e de gestão; as políticas de atração e captação de investimento em empresas exportadoras, estrangeiras ou não, através de isenções fiscais, e de licenciamento, subsidiação e diplomacia económica; a construção de parques industriais com condições especiais de ocupação, por parte dos poderes autárquicos; a baixa relação distância-tempo em relação aos mercados importadores, devido, à já referida localização atlântica do concelho; e a localização a aproximadamente uma hora de centros que estão nos 10 maiores exportadores do Norte (Barcelos, Braga, Guimarães, Porto e Vila Nova de Famalicão) e Vigo, podendo partilhar conhecimento e propiciar lazer”.

Já sobre os resultados de Vila Nova de Cerveira, José Escaleira refere que o concelho apresenta “o maior volume de negócios, a seguir a Viana do Castelo, com o menor número de empresas dos concelhos do  Alto Minho”, lembrando que  “a grande dimensão das empresas instaladas, no Alto Minho, pertencem parte delas a capital estrangeiro”. “Este concelho tem contado com políticas específicas da autarquia, na construção de parques industriais, na prossecução de políticas atraidores de capital, nomeadamente, estrangeiro (espanhol e alemão), com a disponibilização de condições vantajosas (facilitação de infraestruturação e política de solos, benefícios fiscais, etc.) e ainda aproveitando a proximidade territorial e a relação diplomática de proximidade com a Galiza, no contexto do Estado espanhol”, enumerou, frisando que “a proximidade dos portos marítimos do Norte de Portugal com boas vias de acesso e a proximidade a com as plataformas logísticas na Galiza valoriza a localização nesta zona fronteiriça de Portugal (Valença e Vila Nova de Cerveira)”. “Notemos que o sector da logística na Galiza representa 4,2 % do PIB, emprega aproximadamente 50 000 pessoas e agrupa mais de 12 000 empresas”, disse, destacando ainda “a afluência de recursos humanos estrangeiros para colmatar a necessidade de mão de obra”.

Para que os Munícipios do Alto Minho possam crescer ainda mais nesta matéria, o antigo professor considera importante “a cedência de terrenos municipais e uma política orientada de infraestruturação para terrenos destinados à indústria” e, por outro lado, “dentro das suas competências políticas, estabelecer uma política fiscal e de licenciamentos dirigidos, bem como a isenção de taxas ou redução da derrama, como incentivo de fixação”. “A política fiscal e económica autárquica possui poucos instrumentos, mas decisivos para a atração e desenvolvimento das empresas exportadoras”, salienta, defendendo ainda “a continuação da construção e ou candidatura a projetos de infraestruturação rodoviária como forma de escoamento rápido de mercadorias”, “a construção de parques industriais, associada a uma boa diplomacia económica, com um estruturado marketing de captação”,  e “a necessidade de dotar condições de vida digna a imigrantes devido à falta de mão de obra”. “Seja pela humanidade da condição de vida, seja pelo contributo para o aumento da produtividade nas empresas, os municípios devem pensar em políticas de habitação e de formação dedicadas a esses ativos. É certo que, muitos desses trabalhadores, possuem contratos a prazo, mas a fixação de novos habitantes em territórios tão deficitários em termos de população como no Alto Minho, potenciaria políticas de desenvolvimento futuro”, justificou, alertando para algumas ameaças e riscos que advêm da excessiva especialização territorial em indústrias exportadoras, nomeadamente, de capital estrangeiro. “Dado que as sedes das empresas exportadoras não se situam nos territórios de produção, a repatriação dos lucros faz com que grande parte do valor acrescentado gerado na região, de lá saia, nomeadamente em territórios de salários baixos. E, de pouco recurso a empresas locais”, disse, apelando aos responsáveis locais para estarem atentos “às chamadas empresas “tenda de beduíno” que, não sendo ligadas à região, aproveitam as condições oferecidas enquanto lhes interessem, “levantando a tenda” quando vislumbrem oportunidade melhores noutros locais”.

Apesar dos riscos, José Escaleira alerta ainda para a importância do turismo e, neste sentido, crê que os Municípios devem continuar com “a política bem sucedida de desenvolvimento e organização do território virada para o lazer, nomeadamente, na construção de passadiços, no estudo e reativação de trilhos na natureza e na musealização imaterial do património cultural histórico, monumental, tradicional e popular, entre outros”. “Também o incentivo à cultura gastronómica e ao estabelecimento de unidades hoteleiras e de alojamento, beneficiariam as políticas direcionadas para o turismo”, acrescenta, sublinhando que, “sabendo tirar as necessárias vantagens da atividade turística, deve ser escolhida uma estratégia que permita o crescimento das receitas retidas no país, que crie postos de trabalho qualificados, mas que contenha o peso do turismo na economia”.

Tags Economia

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