Também no Inverno rebentam flores

Marlene Ferraz
14 Jan. 2025 3 mins
Nós, bichos sociais

A esperança faz com que continuemos a adubar o chão mesmo quando a florescência se anuncia impraticável.

Estamos a começar de novo. O mundo grande movimenta-se, o nosso mundo mais minúsculo também. Avançamos, inevitavelmente, mesmo que as circunstâncias se apresentem desfavoráveis. Dizem os especialistas que nunca vivemos tão bem, mas continuamos com contrariedades e contradições do funcionamento humano: trabalhamos muito, consumimos muito, acumulamos muito, adoecemos muito, perdemos muito. E lutamos uns contra os outros. Podemos (facilmente) apontar a vida como uma máquina devoradora de tempo e encanto, mas, a forma como a nossa cabeça (inclui os batimentos do coração) se posiciona perante o desafio leva, claro, a caminhos diferentes para a criatura que somos no individual e no coletivo. Susan Neiman, uma boca da filosofia contemporânea, em entrevista à Visão, diz com certeza: se sucumbirmos à tentação do pessimismo, consideraremos que não há nada a fazer e poderemos desistir de lutar por um mundo melhor – e, se assim for, sim, ficaremos condenados a viver num cenário ainda menos suportável.

Mas, se mudar o mundo nos parecer um exercício impraticável, tentemos, pelo menos, manter a esperança para adubar o chão à nossa volta, com utopias mais abreviadas, mas, mesmo assim, indiscutivelmente úteis e necessárias para garantir maior probabilidade de florescência no chão de todos. Susan Neiman avisa mesmo: a esperança é uma obrigação moral, até porque, mesmo que esperemos o pior, só com esperança continuaremos a aspirar melhorar as coisas. Portanto, comecemos por listar as renovações que gostaríamos de fazer no nosso mundo mais íntimo, sem exagerar na carga ilusória, claro, mas com suficiente para que, perante imprevistos e impedimentos, não abandonemos a intenção. Viver mais? Dormir mais? Andar mais? Amar mais? Sabemos que janeiro é apenas a continuidade do mês anterior, mas é também o primeiro do novo ano. E, como lemos num poema de Adília Lopes: estou sempre a começar.

PRÁTICA

– alinhavar uma lista de melhorias praticáveis que gostaríamos de exercitar neste novo ano (pode ser dedicarmos mais tempo às relações importantes, lermos mais poesia, tirarmos um curso de jardinagem, caminharmos mais junto ao mar ou fazermos voluntariado numa associação de animais)

– transformar o desânimo em intenção (termos presente que é provável nos desviarmos das metas, sentirmos culpa por não persistirmos ou vontade de desistir por parecer demais, mas importa afixar o lembrete de que podemos recomeçar a cada manhã e que apenas com investimento consistente chegaremos a resultados esperados)

– manter a certeza de que poderemos ajudar o mundo a ser humanamente mais agradável e, neste sopro de esperança, contribuir com simples gestos todos os dias (sermos delicados com os outros, acumularmos menos plástico, cuidarmos da natureza, cuidarmos também de nós)

“A esperança é estar capaz de ver que há luz apesar de toda a escuridade.” Arcebispo Desmond Tutu

Floresçamos. Juntos.

Tags Opinião

Em Destaque

Notícias atuais e relevantes que definem a atualidade e a nossa sociedade.

Opinião

Espaço de opinião para reflexões e debates que exploram análises e pontos de vista variados.

Explore outras categorias