O Seminário Diocesano Frei Bartolomeu dos Mártires não está situado no alto do monte de Santa Luzia, em Viana do Castelo, mas tem uma vista igualmente privilegiada para toda a cidade. Dali pode observar-se e escutar-se o céu, o mar, o rio, as serras e montanhas. Ainda assim, o mais interessante está na sua forma de construção: Ichthus. Um símbolo em formato de peixe, que representa a presença de Jesus Cristo entre os homens, e que estabelece para sempre a nova e eterna aliança. No seu coração, moram onze jovens e três membros da equipa formadora: Pe. José Domingos (reitor), Pe. João Martinho e Diácono João Basto (formadores).
Numa conversa sem filtros, Tiago Parente, Pedro Ferreira, Gonçalo Barros, Pedro Mendonça, Tomás Martins, Miguel Costa, Tiago José, Paulo Sousa, Daniel Barros, António Alves e Jorge Silva, explicaram o motivo da sua entrada para o Seminário, desvendando que sofreram de bullying por quererem ser padres. No entanto, “o apoio incondicional” da família e dos amigos mais próximos, foram a chave para se manterem no Seminário, descobrindo se é este o caminho que querem seguir para o futuro.
O Seminário Menor contempla alunos do 7º ao 12º ano que o caracterizam como “discernimento, família, fé, aprendizagem, comunidade, alegria, fraternidade e união”. “Sempre gostei de frequentar a catequese e ir à Eucaristia. Um dia, o meu Pároco convidou-me para visitar o Seminário e como gostei, decidi vir”, contou Tiago José. Pela mesma razão, muitos outros decidiram arriscar e começaram a frequentar os encontros do pré-seminário. “Um dia, o meu Pároco perguntou, na catequese, se havia alguém que gostasse de vir a ser padre. Não sabia muito bem como dizer que sim, mas a vontade cresceu dentro de mim e, em 2017, após um encontro de Liturgia, inscrevi-me”, recordou Daniel. “Num dia normal, fui de bicicleta para a catequese (risos) e os seminaristas fizeram uma apresentação. No fim, o Pe. João Martinho chamou por mim e convidou-me a conhecer o pré-seminário. Disse-lhe que sim e, depois da primeira reunião, continuei a vir”, acrescentou Paulo, admitindo que queria perceber se esta era a sua vocação.
“Estamos aqui para perceber se esta é, ou não, a nossa vocação”
Há um mês e meio a frequentar o Seminário, Tiago Parente e Pedro Ferreira asseguram que estão a gostar. “Está a ser divertido conhecer novas pessoas e seguir a vocação de Deus. Além disso, apercebemo-nos de que temos mais fé do que aquela que pensávamos”, confidenciou Pedro. Já Tiago José, Gonçalo Barros e Pedro Mendonça admitem que tinham uma ideia do Seminário “muito diferente” daquela que têm agora. “Era um sítio onde formavam homens para ser padres e que pouca ou quase nenhuma liberdade tinham, mas a verdade é que o Seminário revelou ser um sítio onde há, e temos, várias liberdades”, garantiu Pedro, salientando que têm a sua privacidade. “Ouve-se ainda dizer que não se pode sair do Seminário, que temos todos os dias muitas Missas, que só rezamos e que não temos internet, televisões e etc.”, acrescentou Paulo.
Sobre os medos e receios, Miguel Costa disse que nunca os sentiu e que vê num padre, “uma pessoa que cuida do seu rebanho e espalha a palavra de Deus”. “Para mim, um padre é o mensageiro de Deus”, acrescentou Tomás Martins.
Apesar do que as pessoas pensam acerca do Seminário, Daniel Barros e António Alves afirmam que ainda existe “muita coisa” que os fascina em Jesus. “Não vimos para aqui só por vir. Tem de haver o chamamento interior. Mesmo nas reuniões com o Pe. Nuno – diretor espiritual do seminário – vamo-nos apercebendo se a vontade de continuar nesta caminhada de descoberta aumenta ou diminui. Daí a palavra ‘discernimento’, porque estamos aqui para perceber se esta é, ou não, a nossa vocação: ser padre”, considerou Daniel. “Estando aqui há muitos anos; uma pessoa fica acomodada e familiarizada. Por isso, dá-me ânimo vir para aqui e estar com a minha segunda família. É uma experiência diferente e, quando estou de férias, só penso quando é que volto”, admitiu António.
Já há sete anos no Seminário, Jorge encontrou a música e, na reta final, de ir para o Seminário Maior, sente-se “ansioso”. “É uma casa nova e, por isso, haverá mudanças. Vou sair da minha zona de conforto e terei muitas saudades”, confidenciou, frisando que ganhou “mais responsabilidade”. “O Seminário fez-me crescer na fé e na música, por exemplo. Tornou-me, acima de tudo, o homem que sou hoje”, afirmou.
“Se tivermos o apoio principalmente da família e amigos próximos, é tudo mais fácil”
Os jovens recordaram ainda as dificuldades que sentiram quando decidiram entrar para o Seminário, confidenciando que sofreram de bullying. “Senti medo porque, quando o meu Pároco veio falar comigo, tinha-me dito que um rapaz também ia entrar e que o conhecia. Quando o vi, tive receio de lhe perguntar se era ele o rapaz, mas ganhei coragem e fui ter com ele”, lembrou Gonçalo. “Às vezes nem é só o bullying por parte dos amigos, mas da própria família. Eles não aceitam, e queriam que fôssemos médicos ou advogados. Eles acham que seguir Jesus não deve ser o nosso caminho e então, pressionam-nos e fazem com que os jovens desistam”, acrescentou outro seminarista. Já Miguel admite que, por vezes, se sentia desmotivado. “No contexto da escola, entender já não é solução, porque é motivo de gozo para tudo. Só um amigo meu é que soube da minha vinda para o Seminário. Tive de guardar segredo, porque tinha medo”, revelou. “Tinha um amigo que ia comigo à Missa e acolitava, mas na escola nunca me defendia porque tinha medo. Ele sempre apoiou a minha decisão, mas, com medo que os amigos também o colocassem de parte, não fazia nada”, contou Daniel.
Ao contrário de Miguel e Daniel, Paulo assegura nunca ter sofrido de bullying. “Nunca me disseram para não vir e a minha família sempre me apoiou. Aliás, ficaram contentes com a minha vinda para o Seminário e os meus amigos disseram-me que, se era isto que queria, para vir”, disse. “Durante esses anos em que gozavam comigo, aprendi a ignorar. Muitas vezes, virava costas, mas é uma coisa que, mesmo assim, é duro de se ouvir. No entanto, se é isto que queremos, conseguimos sempre seguir em frente”, acrescentou Miguel, encorajando outros jovens a arriscar. “Acima de tudo, não podem ter medo. Se é isto que lhes traz felicidade, devem entrar para o Seminário para fazer esta caminhada de discernimento. Não devem desistir só porque os amigos gozam com eles”, apelou Daniel. Para os mais novos, o que os torna “mais fortes” é o apoio da família. “Até o nosso Pároco nos incentiva a continuar cá”, disse Tiago José. “Quando me diziam que não devia seguir isto, ouvia uma voz internamente que me dizia para não ligar e seguir os meus princípios”, ressaltou Gonçalo. “Se tivermos o apoio principalmente da família e amigos próximos, é tudo mais fácil”, frisou Miguel.
Após vários anos no Seminário, os jovens asseguram que continuam a ser as mesmas pessoas desde o primeiro dia em que nele entraram. “Quando me diziam que ainda era muito novo para tomar uma decisão destas, refletia sobre o assunto para perceber se seria uma boa decisão entrar para o Seminário. Tive ainda a oportunidade de fazer mais um ano de pré-seminário para, realmente, perceber se era por aqui o meu caminho. Interiormente, estava preparado e aqui estou”, referiu Gonçalo. “Quando estive no pré-seminário e mais perto do fim, tive que decidir se vinha para o Seminário ou ficava mais um ano no pré-seminário. Em princípio, queria estar mais um ano porque tinha as aulas de música, mas quando soube que podia continuar a seguir música e manter-me no Seminário, nem hesitei”, terminou Paulo.
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