“Saliento o quão decisiva tem sido a importância dos fundos comunitários para a recuperação do nosso notável património”. As declarações são de Isabel Cordeiro, Secretária de Estado da Cultura, aquando da recente reabertura do Mosteiro de Santa Clara-a-Velha, em Coimbra. Carlos Costa, responsável pelo atelier de conservação e restauro Samthiago, não podia estar mais de acordo. “Neste momento, os trabalhos de conservação e restauro vivem muito daquilo que são os dinheiros comunitários. Aliás, grande parte dos nossos trabalhos são realizados tendo como base esses fundos”, afirma. A preocupação é, por isso, o médio e longo prazo. “Quando esses fundos acabarem, como é que vamos fazer para conservar o nosso património”, questiona. A esse fator junta-se, ainda, um baixo nível de mecenato e uma parca capacidade financeira que consigam cobrir, em pleno, os custos associados aos processos.
Recentemente, venceram o Prémio Gulbenkian Património pelo trabalho que realizaram no projeto de conservação e restauro dos tetos mudéjares (de estilo islâmico tradicional) da Sé do Funchal, na Madeira. Segundo contam, tratou-se, possivelmente, do “maior contrato público na área”, um trabalho que foi, também, desafiante pelo lugar em si mesmo: uma sé catedral que, além de manter o ritmo litúrgico normal, se situava num território não continental.
“Tínhamos alguns técnicos de lá, mas não há muitos técnicos desta área, no Funchal. Depois tivemos uma grande agência de contratação de equipas, porque são precisos técnicos com formação superior e com anos de experiência. Tivemos, inclusive, de recorrer a técnicos de Espanha e Itália. Tivemos de enviar os materiais por barco, em contentores. E mesmo em termos de logística de andaimes, não existem grandes empresas na Madeira”, conta.
Nessa fase, a empresa chegou a ter mais de 40 trabalhadores, estando 36 deles afetos à obra que decorria em território insular. No entanto, em tempos normais, o número de trabalhadores estabiliza em 12. Em todos os casos, ter formação superior é absolutamente imprescindível. “Para fazer intervenções e poder assinar um projeto de restauro num bem classificado, precisamos de ter os 5 anos de formação”, explica.
A conversa decorre num espaço na zona suburbana de Viana do Castelo. É lá que Carla, umas das técnicas associadas ao atelier, cuida das peças mais pequenas. Conta que, se não tivesse ingressado na área, talvez fosse hoje uma “arquiteta frustrada”, assim como Carlos, que desejava cursar design, e para quem o curso de conservação e restauro foi a segunda opção.
Para ambos, cada peça nova é como uma “prenda de Natal”. Depois da sua chegada, decorre um diagnóstico e uma análise da metodologia a aplicar. “Não há bons nem maus restauros”, explica Carla, “há opções de trabalho”. “Um mau restauro, não é, sequer, um restauro”, especifica, mais à frente, Carlos. O objetivo é mostrar “respeito pela peça e pelo autor”, “chegar ao original”, “tirar as purpurinas”, usando um exemplo presente no espaço. “Não basta pintar por cima. O que se pretende, é integrar a peça”.
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