Em 2023, a presidente da Sociedade Portuguesa de Terapia da Fala (SPTF) afirmou que a procura de terapia da fala é “sempre superior à capacidade de resposta”, quer seja dentro dos hospitais, quer seja no âmbito mais educacional. No entanto, Paula Correia garantiu que o cenário “ainda não é dramático”. Em Viana do Castelo, há um projeto preventivo que leva um terapêutico da fala a cinco jardins de infância de três agrupamentos escolares. No ano passado, encaminharam 31 crianças, das quais 24 foram para terapia da fala.
“Palavras com Som”. É o nome do projeto que já recebeu duas distinções. Em maio, recebeu o prémio “Autarquia do Ano” na subcategoria “Apoio às Crianças” e, mais recentemente, recebeu o prémio “Excelência Autárquica” atribuído pela Cidade Social. “Sabe bem receber um prémio pela importância que esta boa prática tem junto da população”, afirma a coordenadora e terapêutica da fala, Ana Sofia Araújo.
Com o objetivo de “promover o adequado desenvolvimento da comunicação humana, potenciando capacidades linguísticas diretamente relacionadas com a aquisição de competências essenciais ao desenvolvimento da criança”, o projeto “Palavras com Som” iniciou no ano letivo 2022-2023, com 77 crianças entre os cinco e seis anos, em seis jardins de infância de três agrupamentos.
No ano letivo 2023-2024, estiveram envolvidas 139 crianças de quatro jardins de infância de dois agrupamentos (Monserrate e Meadela). Já este ano, o projeto integra 133 crianças de cinco jardins de infância de três agrupamentos (Monserrate, Meadela e Monte da Ola). “Fui desafiada pela Câmara Municipal a desenvolver um projeto nesta área. É um projeto quinzenal que aborda a saúde infantil ao nível das competências exigidas na valência da Terapia da Fala, preocupando-se com diferentes áreas interventivas: fala, linguagem, voz, respiração, mastigação, deglutição e motricidade orofacial”, explicou, revelando que, este ano, vão fazer uma avaliação individual das crianças que não têm apoio da fala. “O objetivo é detectarmos dificuldades e conseguirmos intervir seja nesta área ou outras”, acrescentou, indicando que o número de crianças encaminhadas para intervenção “varia de ano para ano”. “Temos encaminhamentos para terapia da fala, psicologia, otorrinolaringologista e terapia ocupacional”, especificou, dando nota que, no ano letivo passado, encaminharam 31 crianças, das quais 24 para terapia da fala. “Este ano, estamos a aplicar duas baterias de avaliação. Uma delas tem a ver com a articulação verbal e oral (fala) e a outra com a consciência fonológica. Através desta avaliação, temos dados quantitativos que nos permitem, por exemplo, aconselhar a esperar até ao segundo período, encaminhar de imediato ou dar estratégias às educadoras para implementarem nas salas de aula para que a criança deixe de ter a dificuldade”, revelou.
De acordo com uma notícia da RTP, em 2021, a SPTF mostrou-se preocupada com o impacto da exposição excessiva a telemóveis e computadores de crianças, especialmente, durante a pandemia. “Esta situação, agravada pela pandemia, pode criar problemas na aprendizagem e na comunicação dos menores”, salientou a associação. E, Ana Sofia Araújo também concorda com esta realidade, uma vez que “há muitos estudos que indicam que as crianças, que estão muito tempo expostas aos ecrãs, têm dificuldades comunicativas associadas”. “O processo comunicativo não envolve só a fala. As crianças imitam aquilo que vê e ouve dos seus pares. Ao verem vídeos, que muitas vezes, não são em português de Portugal, não ajuda no seu desenvolvimento”, referiu, reconhecendo que “há crianças com dificuldades por outras razões”.
Uma outra parte das crianças envolvidas no projeto são imigrantes e, segundo a terapeuta, a dificuldade maior está em ter acesso à língua portuguesa. “Estes meninos também precisam de estratégias para aprender o português para conseguirem comunicar com os colegas e os adultos do contexto escolar”, apontou.
Para desenvolver o projeto, Ana Sofia Araújo organiza grupos e recorre aos jogos, desde a pesca, dados, dominó e contar histórias. “Trabalhamos muito o som e, nesse sentido, começamos pela palavra e a sílaba”, explicou, sublinhando a importância de adequar e estimular a linguagem para o grupo. “No último ano letivo, as crianças conseguiam acompanhar as atividades. Aliás, no final, sabiam quando trabalhamos as rimas, as sílabas iniciais das palavras e a perceção entre letra e som”, garantiu, frisando que o projeto é “muito bem acolhido” pelas escolas, pelos educadores, pelas crianças e pelos pais. “Trabalhamos em conjunto com os educadores e, a cada início do ano, promovemos um encontro com os pais para esclarecer dúvidas e dar-lhes estratégias para usarem em casa”, acrescentou.
Sem conseguir medir o impacto, a terapêutica assegura que, a longo prazo, “trabalhar precocemente estas questões, sobretudo, da consciência fonológica”, é “muito positivo” na aprendizagem das crianças no 1º ciclo. “O nosso grande objetivo é chegar a mais crianças e fazer com que este trabalho dê frutos no futuro porque as crianças com facilidade em percecionar o som também terão mais facilidade na escrita”, afirmou, salientando que haverá “ganhos na saúde” com a aplicação deste projeto. “Quanto mais projetos preventivos melhor. Não é muito comum que existam projetos de prevenção e, aqui, a autarquia está a ser pioneira”, concluiu.
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