Entre maio e outubro, vive-se a “grande problemática do verão”: os incêndios rurais que, segundo Marco Domingues, Comandante Sub-Regional de Emergência e Proteção Civil do Comando Sub-Regional de Emergência e Proteção Civil do Alto Minho, da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, “absorvem mais meios”. De acordo com a investigação de causas realizada pela GNR, a renovação de pastagens e as queimas de sobrantes continuam a ter uma grande expressão na origem de incêndios rurais.
Em maio, a Secretária de Estado da Proteção Civil disse à Lusa que “tudo aponta para que o verão de 2023 possa ser muito complexo” em matéria de incêndios florestais, mas assegurou que o Governo está “a fazer o trabalho de casa de forma muito comprometida e responsável” para enfrentar o período que se aproxima. “Isto é um problema que afeta não só Portugal. Afeta todos os países da bacia do Mediterrâneo e, agora, também outros países que até aqui não lidavam com esta matéria. Portanto, as alterações climáticas têm influência direta nisso e nós temos, obviamente, que ter em conta estas questões na preparação que fazemos para cada época de incêndios, até porque a época de incêndios já não existe e nós sabemos que em qualquer momento do ano podemos ter estas situações”, disse Patrícia Gaspar.
No que diz respeito ao Alto Minho, a Proteção Civil realiza uma observação e análise meteorológica, em que observa o índice de risco de incêndios, como também a probabilidade de outro tipo de ocorrências relacionadas com os riscos naturais que possam surgir em função das condições meteorológicas.
O trabalho com as corporações de bombeiros é de proximidade, e o alerta para missões de socorro pode chegar até estes através de duas vias: o canal 112 ou diretamente dos Bombeiros. “Depois de feita a comunicação, temos de monitorizar e responder às necessidades de quem está no terreno”, explica Marco Domingues, salientando que o Comando Sub-Regional de Emergência e Proteção Civil do Alto Minho trabalha “numa malha não só sub-regional, como também regional e nacional”. “A grande problemática do verão é que os incêndios rurais são o tipo de ocorrência que absorve mais meios. E tudo isto é finito”, atirou, assegurando ainda que é feito um balanceamento para tentar não esgotar completamente todos os recursos disponíveis, para que haja capacidade de resposta a outras situações que vão surgindo. “Quando estamos com um número grande de ocorrências, habitualmente, os nossos vizinhos mais próximos da região norte também estão. Ou seja, o nosso apoio vem do Porto ou de Aveiro para baixo”, contou, lamentando a distância das viagens e alertando para as condições de trabalho. “Muitas vezes, as equipas que chegam do centro ou do sul, vêm de outras ocorrências. Ou seja, estão cansados. E, portanto, temos de acautelar que quem vem dar reforço esteja em condições de combater”, alerta, exemplificando: “Se tenho um grupo que já vem destacado de um incêndio na zona centro nas últimas 24 horas, tenho de garantir alimentação e descanso para que estejam efetivamente capazes de reforçar os trabalhos de combate com eficiência e segurança junto dos elementos locais, que também sofrem as limitações físicas e psíquicas de longas horas de combate aos incêndios.”
De acordo com o Comandante Sub-Regional de Emergência e Proteção Civil, “tudo varia em função do número de ocorrências”. No entanto, reconhece “a reduzida capacidade de resposta disponível no Alto Minho” que se deve, por exemplo, ao número reduzido de bombeiros, que “é transversal em várias organizações”, e a algumas equipas associadas ao ICNF (Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas), que só trabalham durante o dia por uma questão laboral. “Temos a sala de operações que trabalha 24 horas por dia para acompanhar todas estas situações. Temos um tempo de 90 minutos de ataque inicial aos incêndios e, durante esse tempo, o teatro de operações pode ser reforçado em função do ponto de situação e dos pedidos provenientes do Comandante de Operações de Socorro desse mesmo teatro de operações, para resolver a situação no menor espaço de tempo possível. A partir dos 90 minutos, ou a qualquer momento que o Comandante de Operações de Socorro considere que não poderá, por diversos motivos, extinguir o incêndio até 90 minutos, passamos ao patamar de ataque ampliado”, explicou, referindo que a duração do incêndio pode variar consoante a localização, capacidade de acessibilidade e recursos disponíveis. “Todos os concelhos estão em perigo, porque os incêndios rurais têm, na esmagadora maioria dos casos, mão humana associada, seja por negligência, seja por intencionalidade. A partir daí estamos todos em risco, pois dependemos das ações e dos comportamentos de cada cidadão”, considera, dando nota que, nos Municípios de Arcos de Valdevez, Ponte da Barca e Melgaço, as ocorrências são “mais complexas” devido às suas características muito montanhosas. “Paredes de Coura e Valença também são muito afetados, particularmente fora do período mais crítico, cuja maioria das ocorrências está relacionada com a renovação da pastagem”, revela. Esta é uma das preocupações de Marco Domingues, embora o dispositivo seja “mais alargado” no verão, a Proteção Civil também registou incêndios em dezembro, janeiro e fevereiro. “Em janeiro, tivemos nove ocorrências e, em fevereiro, 126. Trata-se de incêndios rurais, em que grande parte estão associados à renovação da pastagem. Isto significa que há uma necessidade para suprimir”, alerta, acrescentando: “Há também incêndios negligentes que, por vezes, são detetados tardiamente e, mesmo no inverno, podem criar danos desastrosos.”
Uma das outras preocupações é a mortalidade devido às queimas de amontoados. Para o Comandante Sub-Regional de Emergência e Proteção Civil, “as pessoas não estão despertas o suficiente para as condições atuais” e há ainda “a dificuldade de fixação de jovens”. “O uso do fogo no noroeste peninsular é tradicional desde sempre. Hoje, quem é que ainda toma conta dos campos? As pessoas mais idosas. Elas continuam com os mesmos hábitos e costumes de sempre, e fazem a fogueira no campo para eliminar os sobrantes e fertilizá-lo com as cinzas. No entanto, é preciso ter consciência de que não têm a mesma mobilidade/capacidade que uma pessoa mais nova”, defende, confidenciando que, em 2018, a Proteção Civil, no Alto Minho, registou três mortes, e uma em 2022. “Tivemos um aumento significativo de incidentes com queimas de sobrantes agroflorestais amontoados. Em muitas situações, as pessoas tinham limpo o terreno à volta da fogueira e, junto deles, tinham o balde de água. Estamos a falar em períodos mais secos, e uma pequena projeção de material em combustão pode provocar uma nova ignição num ponto mais distante. Não me choca ver pessoas a fazer fogueiras. É sinal de que estão a tratar do território. O que me preocupa, e as questões que se colocam, é quem são essas pessoas e que apoio têm, ou não, para o fazer. Por vezes, estas pessoas não têm a capacidade de perceber que já não têm as mesmas condições físicas de o fazer. É uma questão social que, na minha opinião enquanto cidadão, merece alguma atenção”, apelou, frisando que “os fogos têm, cada vez mais, potencial de dano”. “São mais perigosos do que há uns anos atrás. São mais rápidos e violentos. E, portanto, temos de pensar mais na nossa segurança no período de limpeza florestal, sobretudo, em volta das aldeias. Se tivermos tudo limpo em volta das aldeias, o fogo é muito menos ameaçador e as aldeias e seus habitantes ficam mais protegidos”, atirou.
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