O objetivo da Iniciativa Liberal (IL) para dia 10 de março é aumentar o seu grupo parlamentar, pelo menos, de 8 para 12 deputados. As sondagens mostram que está a crescer, mas, ainda assim, ocupa o 5º lugar. A cabeça-de-lista pelo círculo eleitoral de Viana do Castelo, Marta Von Fridden, acredita que o seu partido irá “surpreender”. Resta saber se é, ou não, com um entendimento com a Aliança Democrática (AD).
Natural do Porto, mas com “uma ligação muito forte” a Caminha, Marta Von Fridden aceitou ser cabeça-de-lista pela IL porque, desde a pandemia, sentiu que “podia fazer mais alguma coisa”.
Durante a entrevista, “o excesso de carga fiscal” foi a justificação para responder a grande parte das questões colocadas. A primeira foi sobre a introdução da “flat tax”, uma medida que estabelece uma taxa fixa (ou única) para todos os contribuintes, independentemente da sua situação financeira.
Em teoria, um imposto único e igual para todos, elimina a complexidade de diferentes faixas de imposto e de deduções fiscais, o que reduz a burocracia e os custos de conformidade. Mas, enquanto os seus defensores argumentam que ele pode incentivar o crescimento económico, promover a criação de empregos e impulsionar o investimento, os críticos apontam para uma injustiça, dado que a medida coloca uma carga tributária maior sobre os indivíduos de baixa renda, em comparação com os mais ricos. “Mas acha que a flat tax é socialmente justa?”, insistimos. A cabeça-de-lista não hesitou e respondeu que “sim”. “É uma questão de equidade. Quando temos uma taxa, a mesma é aplicada a toda a gente. Ou seja, quem ganha mais, também vai sempre contribuir mais. Quem ganha menos vai contribuir menos”, continuou, defendendo “o choque fiscal”. “Havendo a possibilidade de colocar mais dinheiro nos bolsos das pessoas e empresas, existe também um estímulo para a economia e, por isso, isto gera mais riqueza”, justificou.
Marta Von Fridden indicou, ainda, que esta taxa é aplicada noutros países liberais, em que os dados estatísticos mostram que “a classe mais baixa também sobe”. Segundo uma notícia do Expresso, em 2020, são cinco os países que, na União Europeia, têm atualmente uma taxa fixa sobre os rendimentos do trabalho em sede de IRS — sendo que, destes, República Checa, Hungria e Estónia, são países desenvolvidos e pertencem à OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económicos), enquanto que Roménia e Bulgária estão entre os mais pobres da Europa. “Em Portugal, as primeiras simulações à taxa sugerida pela Iniciativa Liberal (de 15%), feitas pela consultora Deloitte, mostram, de facto, que o regime seria favorável sobretudo para contribuintes de maiores rendimentos e que pagam taxas de IRS mais elevadas. O impacto desta taxa fixa seria ainda residual ou mesmo neutro para os contribuintes de menor rendimento, mas com o Estado a perder mais de três mil milhões de euros de receita (o que no ano passado teria significado quase dois pontos percentuais do PIB)”, pode ler-se na notícia que mostra, ainda que, historicamente, “a tendência, no entanto, tem sido de retirada, com três países da União Europeia e a Rússia a abandonarem a taxa fixa nos últimos anos”.
Há ainda alguns críticos que argumentam que a flat tax incentiva os paraísos fiscais. Sobre este assunto, o Notícias de Viana quis perceber a diferença entre os paraísos fiscais e as Zonas Económicas Especiais (ZEE) no interior do país que visam, de acordo com a proposta da IL, “atrair investimento direto estrangeiro, e promover a criação de hubs empresariais”. “Primeiro, é uma medida que não se compara aos paraísos fiscais, à luz do panorama internacional. O que a IL quer, é arranjar modelos de atratividade para outras zonas do território”, começou por dizer, especificando que o Alto Minho, embora seja um distrito de litoral, “apresenta índices de interioridade”. “É muito importante começarmos a perceber que uma zona atrativa em termos fiscais, consegue sedimentar novamente tecido empresarial, que pode ser relevante e interesse para a criação de novas oportunidades. Ao fazer isso, estamos a contribuir para outra coisa: aliviar a grande pressão das duas grandes áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa porque, por exemplo, a crise de habitação que se vive nesses dois territórios tem muito a ver com a procura que existe”, defendeu, sublinhando que “potencia um alívio da pressão e, consequentemente, combate à desertificação e envelhecimento da população”. “O nosso objetivo é criar mecanismos de atratividade em termos de economia, para que seja possível a fixação de emprego e, logo a seguir, de pessoas”, frisou.
Para a arquiteta de 35 anos, hoje, “os empresários/gestores valorizam os trabalhadores porque percebem que, ao estimulá-los e motivá-los, também através de um salário digno, são trabalhadores que vão estar mais cooperantes”. “Nós defendemos a valorização do trabalhador”, salientou, acrescentando: “Nós não partimos de um princípio de uma sociedade em que os ricos são maus e os pobres são bons. Nós partimos de um princípio que é sempre de confiança pelo ser humano, que, empoderado, é tendencialmente bom e vai conseguir exercer essa boa vontade para com a sua comunidade.”
Contudo, uma das explicações para o sucesso recente dos populismos é o ressentimento de grande parte das classes trabalhadoras para com as elites económicas, por se sentirem desprezados por elas. “Isso não é resultado do modelo económico liberal que a Iniciativa Liberal defende?”, perguntámos. “O que está a acontecer hoje com os fenómenos populistas, tem a ver com o descrédito das instituições”, respondeu, considerando que, nos últimos anos, “muitas das pessoas que estiveram à frente de instituições não as valorizaram e dignificaram”. “Quando temos pessoas que encabeçam instituições, que são intemporais e que não respeitam esses princípios e valores, damos azo a que haja revolta. É absolutamente normal e, por isso, o que acho hoje, e isto está a acontecer em algumas partes da Europa, é que temos pessoas muito incompetentes a governar”, considerou, frisando: “Precisamos de pessoas sérias à frente das instituições democráticas. Não tenho dúvidas em relação a isso. Não acredito que o populismo seja uma resposta ao combate à corrupção. Eu acredito em políticas sérias e políticos sérios. As pessoas sérias são a resposta à corrupção.”
Apesar de todos estes pressupostos, contrariamente à generalidade dos restantes partidos, a IL não tem uma proposta relativa às questões morais. “Onde é que fica o bem comum no modelo de sociedade proposto pela IL?”, perguntámos. Rejeitando o coletivismo, a cabeça-de-lista considerou que “o bem comum é alcançado através do empoderamento da própria pessoa”. “Nós defendemos a valorização do indivíduo e a sua liberdade, e não a submissão da pessoa a um ideal de grupo. Não cria sociedades felizes”, referiu.
Aliada a este pensamento, a IL defende também uma “cultura da meritocracia”. Um sistema baseado no mérito que, de acordo com o sociólogo britânico Michael Young, acabaria por criar uma distopia social: “as elites iriam considerar-se moralmente menos responsáveis pela sorte dos mais desfavorecidos.” No livro «Era do Nós», João Ferro Rodrigues acrescenta que “agora seriam pobres, e ainda por cima toda a sociedade lhes apontaria o dedo, indicando que a pobreza seria da sua responsabilidade. Ou seja, adicionou-se agora um insulto moral ao prejuízo da pobreza. Com consequências graves para a possibilidade de defesa de um bem comum apelativo a todos”.
“A IL entende que o mérito promove a excelência. A valorização do mérito combate outro tipo de coisas, como por exemplo, os regionalismos e os nacionalismos”, referiu Marta Von Fridden, exemplificando: “Temos entidades reguladoras em que os Conselhos de Administração são nomeações políticas. Não estou a dizer que essas pessoas, depois, não sejam competentes. O que estou a dizer é que os critérios de nomeação, muitas vezes, funcionam com um cartão partidário, e não com um cartão baseado no mérito da própria pessoa exercer aquele cargo ou competência.”
A cabeça-de-lista defendeu, ainda, que “o que tem de vir para a frente é a competência da pessoa”. “Mas, os contextos económicos, sociais e financeiros, não têm qualquer impacte no mérito?”, questionámos. “Eu não sei se um jovem, que venha de uma família muito rica, mas com pais completamente alienados, será favorecido num percurso profissional, paralelamente a um jovem de uma família de classe média-baixa, em que os pais passam um conjunto de valores importantes”, argumentou, frisando que não acredita na distinção baseada na classe social. “Os valores fundamentais são os valores da educação. A educação é o nosso grande elevador social, e não a nossa conta bancária”, acrescentou.
No que diz respeito à saúde e à educação, a IL defende uma “reforma absoluta” através da “liberdade de escolha”. “Queremos que haja mais acesso à saúde e, enquanto utente, não tenho de estar preocupada onde vou ser tratada. Eu tenho é que me sentir bem por estar a ser tratada por profissionais em quem confio, seja o sector público, privado ou social”, considerou Marta Von Fridden, acrescentando que, na educação, o propósito é o mesmo. “Para além de propormos um modelo de financiamento que permite ao aluno escolher a sua escola, independentemente de ser pública ou privada, defendemos que as escolas devem ter mais autonomia administrativa, pedagógica e financeira”, especificou, lamentando o modelo de sala de aula “que não evoluiu desde a revolução industrial”.
A este propósito, em 2020, o Polígrafo analisou a proposta da saúde, e definiu-a como “imprecisa”. Num site criado, onde a IL vai disponibilizando perguntas e respostas sobre alguns dos temas centrais do seu programa, o partido invoca dados do Euro Health Consumer Index (EHCI), um índice internacional que compara o desempenho dos sistemas de saúde dos países europeus, analisando resultados, capacidade de resposta, entre outros fatores. Neste índice, Portugal está “apenas” no 13º lugar. “Analisando o último relatório do EHCI, relativo ao ano de 2018, podemos confirmar que Portugal está no 13º lugar do ranking. No entanto, a análise do EHCI é diferente da que é realizada pelo IL, uma vez que coloca o nosso país na metade superior da lista – são 35 países no total -, destacando um sistema de saúde com “um desempenho forte” e um bom resultado na relação qualidade-preço”, lê-se no artigo.
De acordo com a análise, “Suíça e Países Baixos fixam-se no primeiro e segundo lugares, respetivamente, enquanto França e Alemanha estão no 11º e 12º lugares. A pontuação dada à Alemanha foi apenas 31 pontos (em 1.000) superior à de Portugal. É também por isso que, no gráfico geral do EHCI, Portugal aparece na mesma categoria de países como Alemanha, Países Baixos, França ou Suíça. E, como tal, pintado a verde. Neste gráfico, a legenda faz corresponder o verde a um bom desempenho, o amarelo a um desempenho médio, e o vermelho a um mau desempenho”. Aqui, o Polígrafo deteta “um problema de consistência dos dados”. “A informação relativa ao tipo de sistema de saúde é colocada no mesmo gráfico que a informação do EHCI, sendo apenas indicada uma fonte para ambas. Ora, o EHCI não efetuou uma análise dos sistemas de saúde tendo em conta a sua natureza, nem há qualquer correlação entre a natureza do sistema e respetivo desempenho”, justificou, concluindo: “(…) a ideia geral que parece ser retirada desta imagem do IL, é a de que os países com sistemas de saúde similares ao SNS não apresentam um desempenho tão bom como aqueles que têm sistemas mais liberais. O que não corresponde, de todo, à análise e conclusões do relatório do EHCI.”
Já a nível cultural, a IL propõe “liberalizar o mercado livreiro”. “Isso não é o que já existe com as grandes livrarias a dominar totalmente o mercado?”, questionámos. “A proposta da IL sobre a liberalização do mercado livreiro prende-se, essencialmente, com a revogação da ‘Lei do Preço Fixo’, permitindo que o mercado concorrencial funcione de uma forma saudável, e é nesta liberdade concorrencial que as livrarias podem explorar os seus fatores diferenciadores, e otimizar soluções para chegar aos consumidores, que, no limite, irão atrair sempre mais leitores”, argumentou, sublinhando que “a liberalização do mercado livreiro vai, acima de tudo, beneficiar o consumidor”.
Mais especificamente para o Alto Minho, Marta Von Fridden defende, desde logo, a alteração da Lei Eleitoral. “É uma medida apresentada que vem do ano passado, que visa criar mais representatividade entre os círculos eleitorais, principalmente aqueles de baixa densidade, como é exemplo Viana do Castelo, em que perdemos um deputado”, explicou.
Outra das prioridades é “a reforma educativa”, a mobilidade e a habitação. “Temos um Instituto Politécnico com alguma diversidade, mas restrita. Os jovens começam a sair logo quando vão estudar para a faculdade. Ou seja, abandonam logo o distrito e, muitas vezes, a maioria já não volta. Aqueles que ficam no distrito não ingressam no ensino superior, ou alguns ingressam com uma taxa de sucesso muito baixa”, referiu. Ainda assim, no ano passado, o Instituto Politécnico de Viana do Castelo integrou, pela primeira vez, a lista das melhores Instituições de Ensino Superior a nível mundial, no prestigiado Times Education World University Rankings 2024, destacando-se na internacionalização e na qualidade da investigação, na relação com a indústria, na qualidade do ensino ministrado e, por fim, no volume da investigação realizada.
Já sobre a mobilidade, a cabeça-de-lista afirma “não ter qualidade” e, na habitação, “existe muita pouca oferta”. “Temos um potencial de território que está muito pouco explorado”, lamentou, defendendo: “Se aumentarmos a oferta de habitação, vamos ter mais gente a conseguir fixar-se aqui, em termos de emprego.”
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