Ainda faltam quarenta dias para a chegada da Primavera, embora muitos já se esforcem por antecipar a estação. O frio convida ao aconchego das casas modernas, mas durante o dia já se vislumbram gestos e atitudes de uma etapa que prepara o Verão.
Somos convidados a saborear este tempo de fim de inverno, dizendo adeus ao frio e esfregando as mãos sempre que os graus manifestam a frieza de um tempo que engole os minúsculos animais que nos povoam as terras áridas. Coitados deles, mas o seu desaparecimento pressagia a fecundidade e a beleza de tantos buquês floridos que passarão de mão em mão. A sociedade impõe estas diabruras que o universo executa sem som, nem voz.
Nas vias asfaltadas mais ou menos assinaladas horizontalmente, ininterruptas filas de variados motores, camionetas, automóveis, motorizadas, trotinetes atualizadas, encenam um movimento incessante de quem vai tentando esgravatar no mundo que tem para abrir a um outro que ainda não chegou, mas pouco tarda. Pouco se usam as buzinas, mas parece que se apertam aceleradores que só amainam, quando se vislumbra um limite com sinais evidentes de que há registo de quem passa, registo de polícia fixa sem uniformes visíveis. As reprimendas aparecem meses depois. Este movimento ainda não se faz sozinho, mas exige gente apressada por agora!
O teclado no qual escrevemos já pouco precisa de movimentos, mas apresenta o pensamento quase antes de ser pensado, não fossem algumas dores de cabeça que a racionalidade exige. Dispensa-se mais tempo para reler os escritos do que para colocar o pensamento nas palavras que saltam dos dicionários. Somos ultrapassados pelo que tão delicadamente vamos construindo ao longo dos dias.
Temos agora mais tempo para a reflexão e para disfrutar da vida que nos é dada, ainda que aqui ou acolá sejamos ultrapassados fingindo o nosso desconhecimento e até a nossa iliteracia. Mas a História sempre foi assim, ensinando uns e mandando outros para a esfera do desconhecimento, porque atemporais e com horas e horas de amargo isolamento sucessivo. Uns atingem a maioridade e a velhice, enquanto outros se regozijam de tantas conquistas e de tantos trunfos. É necessário que uns descansem para que outros labutem mais facilmente com os desenvolvimentos a que todos demos origem.
As coisas fluem de mão em mão, mesmo sem enxergar o mistério que possa surgir de quem passa e de quem recebe. A vida no planeta depende de cada um e de todos. Baloiçando, se vão fazendo mistérios impensáveis. Que cada um baloice sem cessar e que ninguém lhe impeça a obra, que ninguém impeça muitos de chegarem longe. Todos usufruem do direito de habitar a terra que é sua também. Que a forte incúria de alguns mais abastados não seja travão para a pobre caminhada de tantos outros. O universo está em transformação sempre. Que impere a igualdade, o respeito e o bom senso! Como lhe chamaremos mais tarde?
Não nos retirem o dom de pensar. Nunca.
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