Um dos grandes equívocos da história da arte não tem sido só a confusão entre autor e obra, mas também a convicção de que esse autor, para ser relevante e assertivo, necessita de um estilo distante, excêntrico e monacal.
Nesse ponto, a Arte na Leira – uma galeria de arte, dentro da residência pessoal de um artista que, por sua vez, reside numa das mais remotas aldeias do Alto Minho – seria sempre um exercício perigoso e arriscado para evitar os mal entendidos que acima citamos.
Desde a antiguidade clássica, o lugar dos deuses parece estar circunscrito ao céu. Do mesmo modo, ao Olímpico, parecem estar destinados os artistas. Mas, a Serra d’ Arga e, mais precisamente, a Arte na Leira, apesar de não deixar para trás a ideia de altitude e deslocamento geográfico, recusa um paraíso de tons azulados, bordado a dourado e de sonoridades supracelestes.
O dia em que visitamos esta exposição, permitiu-nos perceber que a sua localização não se trata tanto de uma proximidade ao céu, mas de uma opção declarada por estar mais próximo das nuvens.
De facto, se pela presença de nuvens entendemos uma consequente desorientação, esse é um efeito positivo da mostra. Em primeiro lugar, porque não se verá na Arte da Leiria uma tentativa de revivalismo artístico, tão comum no nosso tempo, e que tem ousado recusar as linguagens contemporâneas para pôr de novo a estética barroca e renascentista como única capaz de expressar a beleza e a complexidade do mundo.
Em segundo lugar, em tempos de descentralização de gabinete e regionalização de almofada, a Arte na Leira deixa literalmente os sapatos molhados e cheios de terra. Os cheiros da natureza, as maçãs caídas no pomar, os figos ainda verdes, mas também uma mangueira espalhada à pressa e uma elíptica visível num espaço privado são alguns dos elementos que ajudam a inverter o conceito snob do museu e galeria que, tantas vezes, tem deturpado a dimensão sacral da beleza.
Notícias atuais e relevantes que definem a atualidade e a nossa sociedade.
Espaço de opinião para reflexões e debates que exploram análises e pontos de vista variados.