“Antiquum Ministerium” (“Ministério Antigo”) é o nome que o Papa Francisco deu à Carta Apostólica com a qual, no dia 10 de maio, instituiu, de forma oficial, o ministério laical do catequista, inserida numa preocupação crescente por este âmbito, que tinha já tido um outro momento fulcral com a publicação, em 2020, de um Diretório para a Catequese renovado, em que se afirma que esta “já não se limita a ser um mero momento de crescimento mais harmonioso da fé, mas contribui para gerar a própria fé e permite que se descubra a sua grandeza e a sua credibilidade”.
Considerando que “olhar para a vida das primeiras comunidades cristãs (…) estimula também hoje a Igreja”, o Papa reconheceu, institucionalmente, “a presença de leigos e leigas que, em virtude do seu Batismo, se sentem chamados a colaborar no serviço da catequese”, gesto esse inserido num espírito de “fidelidade ao passado e responsabilidade pelo presente”, atendendo a que, conforme indica Francisco, “o Catequista é simultaneamente testemunha da fé, mestre e mistagogo, acompanhante e pedagogo que instrui em nome da Igreja”.
Em Portugal, onde a Conferência Episcopal Portuguesa se tem debruçado de forma intensa sobre a mesma área, designadamente, com a carta “Catequese: a alegria do encontro com Jesus Cristo”, D. António Moiteiro, Presidente da Comissão Episcopal da Educação Cristã e Doutrina da Fé, sublinha que o repto do Papa indica que “o direito ao apostolado não assenta no Sacramento da Ordem, mas nos Sacramentos do Batismo e da Confirmação”, mas alerta para as “novas responsabilidades” que ele acarreta.
Neste espírito, o Notícias de Viana falou com alguns catequistas da Diocese de Viana do Castelo, ouvindo os seus testemunhos e preocupações, mas procurando, também, fazer um balanço do exercício deste ministério.
“Sou catequista desde pequenina”
A Irmã Olinda Gonçalves é a mais velha dos entrevistados. Natural de Santa Catarina da Serra, no concelho de Leiria, conta que, desde que fez a Primeira Comunhão, foi chamada para ajudar na catequese, algo que seria mais tarde complementado com o Curso de Educadora de Infância, formando as bases de uma vida dedicada, em grande parte, aos mais novos. “Desde pequena que sempre gostei de saber coisas sobre Deus, de ir à Missa … Agora, gosto muito de O dar a conhecer”, assume.
Já Andreia Amorim, de 41 anos, paroquiana em Arcos de Valdevez (S. Paio), confessa que tem aprendido muito com a experiência, quer com as crianças, quer com os colegas. “Foi sem saber nada. Tinha feito a Primeira Comunhão mas tinha desistido, e, quando levei a minha filha, fizeram-me o convite, e ainda bem que aceitei, porque tenho sido muito feliz como catequista”, afirma.
A verdade é que todos os catequistas declaram que fazem um balanço “muito positivo” do ministério que assumiram nas suas comunidades, chegando mesmo a reconhecer que essa experiência semanal transborda e transforma as suas vidas, mesmo que tenham começado “um bocado a medo”, conforme admite Narciso Rocha, da Correlhã. “O contacto com a adolescência coloca-me muito mais divertida, muito mais bem-disposta. Creio que os miúdos me dão uma maneira de ver o mundo diferente”, acrescenta Ângela Dantas, paroquiana de Areosa.
Por seu turno, Soraia Silva é a mais nova de entre os ouvidos. Com apenas 25 anos, começou a ser catequista há nove anos, mesmo no final do seu próprio percurso catequético, e o maior impacte que sentiu foi a responsabilidade, pois começou a acompanhar o grupo do 1º ano e que hoje ainda mantém, mas já nas proximidades da receção do Sacramento da Confirmação.
“Os miúdos são muito abertos à novidade e gostam de se sentir amados”
De facto, quer Soraia Silva, quer Ângela Dantas concordam que a inserção de temas da atualidade nas sessões de catequese estimula o interesse dos catequizandos, chegando esta última a admitir mesmo alguns momentos de “disputa” mais intensa face às opiniões expendidas durante debates. No entanto, não deixa de afirmar que “os miúdos são muito abertos à novidade e gostam de se sentir amados”.
Na verdade, Andreia Amorim, à pergunta sobre a importância da catequese e sobre o que ainda pode ser feito para intensificar este ministério, afirma categoricamente que são “os catequistas que têm de se moldar aos novos tempos e aos catequizando, e não o contrário”. “Se calhar, esta pandemia fez-nos pensar sobre o modo pelo qual podemos cativar estes jovens, porque, talvez, não o estivéssemos a fazer da melhor forma, isto porque eles não querem que debitemos orações, mas querem, antes, que os incentivemos de outra forma, através de catequeses mais práticas, levando-os, por exemplo, a contactar com outras realidades”, disse, acrescentando: “Amar o próximo também é catequese, e esquecemo-nos disso, porque estamos muito focados, por exemplo, no modo como eles e elas estão sentados na Missa.”
“Antigamente…”
Efetivamente, questionado sobre a diferença entre a catequese que fazem com os seus grupos e a que receberam, todos são perentórios a focar a mesma diferença. “Antigamente era tudo muito mais à base da memorização; agora temos mais em conta a experiência concreta”, certifica a Ir. Olinda Gonçalves, algo corroborado por Ângela Dantas: que, na ocasião, se aprendia “tudo o que era fórmulas”, sem que isso se traduzisse num conhecimento e interiorização reais, reconhecendo, inclusivamente que, a mudança de paradigma que se foi realizando foi uma das dificuldades iniciais que encontrou no seu serviço à comunidade.
“Antigamente era uma manhã e uma tarde a aprender o Pai-Nosso, a Avé-Maria e o Credo; agora levamos um ano inteiro a apreender o Pai-Nosso, tudo aos bocadinhos. Temos uma catequese mais experimental, concreta, de acordo com as mentalidades e capaz de aceitar o que acontece no nosso mundo. Antigamente era decorar e decorar”, retoma a Ir. Olinda.
Contudo, e apesar de caracterizar a catequese atual como “mais estruturada, e capaz de chegar mais fundo, que a anterior”, Narciso Rocha recusa-se a diabolizar tudo o que se fez para trás, pois, como afirma, “antigamente, quando íamos para a catequese, já se levava uma parte da catequese feita desde casa, ao passo que hoje é raro falar-se de Jesus Cristo dentro de portas”. Introduzindo, assim, um outro sublinhado comum: “a falta de compromisso por parte dos pais”.
Mesmo apesar da idade, a Ir. Olinda alerta que são estes que devem ser alvo de uma atenção prioritária, dado que, não raras vezes, “as crianças escutam a catequese, estão muito recetivas e interessadas, vão para casa transmitir aquilo que ouviram, e os pais não sabem do que falam”.
Não obstante, todos identificam outro problema, que vai para além da simples falta de conhecimento, e face ao qual parecem sentir-se impotentes. Ângela Dantas fala da uma vontade dos pais quererem desligar-se, e Soraia Silva acredita que não incentivam as crianças a comparecer, e que cedem ao primeiro capricho dos filhos. Já Narciso Rocha constata que os obrigam a ir, mas que isso não se traduz num testemunho da sua parte, antes pelo contrário. Ainda assim, certifica que, apesar de, muitas vezes, chegar ao final da sessão e pensar que os catequizandos “não aproveitaram nada e que estiveram sempre na brincadeira”, acaba por constatar, mais tarde, que se lembram do que se passou, até mesmo em anos anteriores. “Pode não ficar o garrafão inteiro, mas um cálice fica sempre”, afirma.
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