Algures em julho, na segunda fase do exame nacional de Português do ensino secundário, os alunos foram confrontados com um texto do Cardeal José Tolentino Mendonça que aborda a temática da gestão do tempo. O frenesim em que vivemos, cuja génese remonta à Revolução Industrial, é um assunto de grande atualidade e são conhecidos os efeitos que provoca quer na saúde das pessoas, como o stress e a ansiedade, quer nas relações interpessoais, deteriorando-as, por vezes, irreversivelmente.
A época do ano em que nos encontramos, por ser a altura em que, tradicionalmente, grande parte das pessoas goza férias, constitui uma excelente oportunidade para pararmos e refletirmos sobre a forma como gerimos o nosso tempo e sobre os objetivos que atingimos e os que ficaram por cumprir e, principalmente, para discernirmos aquilo que realmente nos é mais essencial e nos traz felicidade. Quantos de nós lamentam a falta de tempo para repousar, acompanhar melhor os familiares (sejam os nossos filhos, os nossos pais ou outros), fazer exercício físico, ler ou conviver com os amigos?!
O legislador laboral obriga a que pelo menos um dos períodos de férias tenha a duração mínima de 10 dias consecutivos (nº 8 do artigo 248º do Código do Trabalho) de forma a garantir uma verdadeira recuperação física e psicológica do trabalhador e a generalidade da população portuguesa fá-lo no verão por coincidir com as férias escolares e para usufruir dos dias mais longos e solarengos do ano. A época é, portanto, propícia à reflexão e o texto do Cardeal Tolentino Mendonça – A arte do inacabado -, é um bom ponto de partida e traz-nos pistas para atingirmos o desiderato de melhor gerirmos o nosso tempo.
Um dos aspetos do referido texto que considero mais relevante é a recusa daquilo que o autor designa por “lógica das compensações”, isto é, «que o tempo que roubamos, por exemplo, às pessoas que amamos procuraremos devolvê-lo de outra maneira, organizando um programa ou comprando-lhes isto ou aquilo; ou que o que retiramos ao repouso e à contemplação vamos tentar compensar numas férias extravagantes».
A outra ideia decorrente do mencionado texto que importa realçar prende-se com aquilo que o autor designa por um “exercício de desprendimento e de pobreza”, isto é, a necessidade de aceitarmos que tudo o que vamos conseguindo realizar não passa de «… uma versão provisória, inacabada, cheia de imperfeições», acrescentando «… que o momento de viragem acontece quando olhamos de outra forma para o inacabado, não apenas como indicador ou sintoma de carência, mas condição inescusável do próprio ser». Julgo que esta segunda ideia da aceitação do imperfeito como algo que é natural à brevidade do tempo nos pode trazer maior tranquilidade e, consequentemente, melhor qualidade de vida.
Assim, termino retomando a ideia inicial de aproveitarmos as férias para redefinirmos os nossos objetivos e as nossas prioridades, mas cientes de que tudo o que fizermos será sempre suscetível de ser melhorado porque a perfeição não existe e a melhor forma de nos aproximarmos dela é aceitarmos a imperfeição como algo intrínseco à vida e ao nosso próprio ser.
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