Peregrinação Diocesana ao Santuário de Nossa Senhora do Minho procura retomar a normalidade, mas sem a adesão pré-pandemia. D. João Lavrador realçou a ternura da invocação mariana, cuja imagem esteve presente no Arciprestado de Cerveira.
A Senhora e a Paisagem
Chuva e trovoada marcavam o início do primeiro Domingo de julho, data em que se realiza a peregrinação diocesana ao Santuário de Nossa Senhora do Minho. De longe, ou de perto, a Serra d´Arga, onde se situa este Santuário, era impercetível. Um enorme bloco de nuvens cobria toda a paisagem, tornando invisível esse planalto bem detetável a vários quilómetros de distância, quando o clima é mais favorável. Depois de dois anos de pandemia, num tempo de normalização progressiva do dia-a-dia, este seria o retornar tão desejado da peregrinação de acordo com os modelos pré-covid-19, contando-se, ainda, pela primeira vez, com a presença de D. João Lavrador, como celebrante. Mas a meteorologia pareceria destinar a espectativa à desilusão, e aquele lugar, que “ilumina o Minho inteiro”, num braseiro tímido e fugaz.
São três horas da tarde e o cenário que se acompanha de manhã parece ter-se eclipsado. E ainda que pressinta uma certa desnitidez no horizonte, o certo é que todos os miradouros e esconderijos de um caminho tão tortuoso, como labiríntico estão desimpedidos. Do adro do santuário distingue-se perfeitamente a estrada que corta o planalto, e mais à frente se precipita encosta a baixo, agora repleta de carros e por onde se aproximam peregrinos e curiosos. A meia distância aglomeram-se alguns postos de venda e dois passos ao lado, debaixo de algumas árvores, o parque de merenda está, ainda, repleto.
A peregrinação saiu da matriz de Vila Nova de Cerveira há pouco menos de uma hora. E fora do Santuário começam a juntar-se cada vez mais peregrinos e romeiros. “Gosto de ver a Senhora a chegar e ver esta paisagem”, confessa Maria de Sá Pereira, oriunda da freguesia de Arcozelo, Ponte de Lima. “A gente aqui até se sente bem”, completa o marido. Não é a primeira vez que vêm à peregrinação e recordam os tempos em que a faziam de manhã, trazendo inclusive o almoço. O curioso é unirem a chegada da Senhora do Minho à paisagem.
De facto, foi essa a intenção do programa iconográfico desta invocação mariana: tornar Nossa Senhora o espelho dos espaços que aquele lugar específico abarca, evidentemente marcado pelo curso dos rios Âncora, Minho, Coura, Lima, Mouro e Vez. Vestida com o fato de lavradeira à vianesa torna-se “a expressão iconográfica de uma mãe que não foge a imiscuir-se nas tarefas agrícolas das gentes minhotas que lhe pertencem como filhas, mas também, numa leitura mais evangélica, ‘os grãos de milho, constituindo um só fruto, podem ser uma alusão à unidade interior, que tanto se verifica na vida da Virgem, como na vida da Igreja’”, explica Mons. Sebastião Pires Ferreira, na monografia Senhora do Minho: do sonho ao santuário.
O encanto
“Já não me recordo há quantos anos é que vim pela primeira vez”, assume Carmo, da paróquia de Gondarém. “Mas recordo-me que fiquei encantada e comecei a vir mais vezes”. Hoje tem 59 anos e é uma das muitas pessoas que se juntam no centro da vila de Cerveira para se despedir da imagem que será transportada pelos bombeiros, num cortejo automóvel ao Santuário. Entre os devotos encontra-se também, Maria Ribeiro, de Sopo, que fica imediatamente emocionada quando começa a ser entrevistada, e é questionada sobre a ligação que tem à Senhora do Minho. “Tenho muita fé com ela”, desabafa.
Foram precisamente as peregrinações pelos vários Arciprestados que levaram Maria Isabel Ramalhosa a estimular a devoção à Senhora do Minho. Entre os últimos preparativos para a celebração explica, que quando conheceu esta invocação acabou por ficar entusiasmada em conhecer o local. Faz parte da confraria há mais de 10 anos e reconhece que “é uma alegria receber as pessoas no santuário, porque sem elas ele não é um verdadeiro santuário”. Por isso o seu contributo passa por estar aí todos os Domingos com o marido, apoiando os peregrinos, dando informações e contando a história daquele lugar.
E entre os muitos peregrinos que se aglomeram dentro da igreja este ano está uma vinda da paróquia de Loivo. Traz às costas um lenço regional vermelho, tal como aquele que veste a imagem da Senhora do Minho. Vem até ao cimo da Serra d´Arga, também, há muitos anos e conta que se lembra de se colocarem aí as primeiras pedras do que hoje é o Santuário. Reconhece que Nossa Senhora a tem ajudado muito durante toda a sua vida e que foi um alívio tê-la no seu concelho.
É também esse o entusiasmo por Maria que Isabel Ramalhosa destaca e que espera que D. João Lavrador também sinta nesta que é a sua primeira peregrinação. “Estou à espero que ele fique entusiasmado e que este lugar o entusiasme também, porque amante de Maria de certeza que ele já é”, esclarece.
Um cristianismo sensível
A peregrinação chegou ao alto da Serra. A atenção de todos coloca-se na carrinha que se vai aproximando paulatinamente. D. João Lavrador recebe a imagem à porta da igreja e dá início à celebração, onde começa por pedir a oração pelas necessidades da diocese e interpela os fiéis a reconhecer em Maria o modelo de paz necessário para o Mundo.
Na homilia salientou a ligação entre a condição humana e a experiência da peregrinação. “Por ela”, destacou, “chegamos à consciência de que por muito que tínhamos aprendido, nunca aprendemos na totalidade, e isso é sintoma de que precisamos de nos encontrar uns com os outros”, visando apontar para a Igreja enquanto Povo de Deus. “As peregrinações nunca as fazemos sozinhos”, reforçou.
O perlado apontou, ainda, para a figura de Maria enquanto “mulher sensível às perplexidades a tudo aquilo que é íntimo” ao coração humano, desvelando o lugar essencial da filiação para a identidade cristã.
“Maria diz-nos ‘tu também és filho de Deus’ e nela Deus ensina-nos a gerar filhos a partir de um coração indiviso”, afirmou, acrescentando que, “enquanto Igreja, somos chamados a reconhecer a necessidade da integridade do amor que une e diversifica”.
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