A desobediência pacífica de uma greve de fome pela educação

É fim de tarde. Entre a tenda e a autocaravana, alguns professores esperam a vez para cumprimentar Luís Braga, também ele professor. Pedem para esperar. Neste momento, está a ser visto por um enfermeiro que monitoriza a reação biológica à greve de fome que, há quase 3 dias, leva a cabo. O motivo de uma “radicalização” do protesto é, nas suas próprias palavras, acreditar que “os professores portugueses não têm sido considerados pelo Governo”.

João Basto
24 Abr. 2023 3 mins
A desobediência pacífica de uma greve de fome pela educação

Acampado à porta da Escola Secundária de Santa Maria Maior, em Viana do Castelo, as acusações saem-lhe diretas e inequívocas: “O Governo não resolve os problemas, mente sobre eles, tenta enganar a opinião pública sobre o estado da negociação, quando, na verdade, não houve acordo nenhum, nem há, sequer, negociação nenhuma”. Em cima da mesa está “uma lei de concursos que é extremamente gravosa para os direitos familiares e pessoais” dos professores, assim como a recuperação do tempo de serviço, “o funcionamento das escolas, a burocracia, a violência e a indisciplina”. 

Ao longo da conversa, assegura que se sente bem, que não está cansado. É, também, por isso, que escolheu esta forma de protesto: para mostrar que os professores nem estão cansados, nem “derrotados”; que há “sempre mecanismos de luta” ao seu alcance. 

Assume que os seus atos podem ser entendidos como atos de “desobediência civil”, mas deixa uma ressalva. Repudia “terminantemente aquilo que tem acontecido em França”, defendendo ações pensadas de “forma pacífica, ordeira e não violenta”, capazes de atingir “outro tipo de efeitos”. Neste caso, uma das prioridades é chamar a atenção do Presidente da República para que vete a proposta do Governo, apesar de Luís Braga reconhecer, ao mesmo tempo, que não tem “a vaidade” de pensar que é um “exemplo”. 

A dado passo, é-lhe perguntado se o seu ato não pode ser visto como uma “excentricidade” individual. Responde, claramente, que não. Alerta que “não está sozinho” e que, apesar de parecer tratar-se de um ato solitário, há determinadas condições e circunstâncias logísticas que são salvaguardadas por outros membros “não menos ativos” no protesto. “Havia outras pessoas que estavam a ponderar fazer o mesmo”, explica, “mas nós somos professores, e achamos que não faz sentido que uma pessoa com filhos seja vista por eles numa posição de fragilidade anímica. Há aqui alguns critérios. Eu sobrei porque sou solteiro, sem filhos, tenho saúde e algumas condições que me permitem fazer isto”, clarifica. No exterior, estendida no chão, uma tarja negra proclama “sem educação não há futuro”, e outra, colocada na perpendicular exige “respeito” para com a classe docente. 

Confrontado com a questão de se o futuro não é um tempo demasiado longo para um país onde grande parte da população está condenada a viver o dia-a-dia, o subdiretor do Agrupamento de Escola da Abelheira confessa que esse é o núcleo do problema. Membro de uma família de professores há, pelo menos, 120 anos, explica que, num país em que os “governantes não pensam sequer no presente”, a classe docente está em contraciclo por o seu objetivo ser precisamente “apostar no futuro”. “A avaliação do nosso trabalho só se faz 30 anos depois da nossa ação”, defende. “Nós pensamos no futuro”, reafirma, e, apesar de todos os defeitos que assume reconhecer aos professores, vê nisso uma “enorme virtude” de que, conclui, toda “a sociedade devia poder beneficiar”.

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