Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das
crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer
lembranças…
Dia de Natal, António Gedeão
Natal é época de ser bom e época de nostalgia. O recordar de outros Natais, o recordar de quem nos falta, e são muitos, o recordar de outros tempos.
Nostalgia de ir ao Porto, logo que começavam as férias, ver as iluminações, ir ao cinema. Os bilhetes do cinema eram bonitos e coleccionáveis. Não eram estes papéis deslavados iguais aos do supermercado. Só o cartaz a publicitar o filme no jornal ou na fachada da sala atraía e suscitava para uma ida ao cinema. Não se comia, nem bebia, durante os espectáculos. Também não se andava a cirandar, a entrar e a sair. Que saudades de um ecrã gigante!
A animação da baixa, se o tempo estivesse bom, claro, só podia ser comparada à de uma noite de São João. Anos, depois, à tarde, já se tinha ido ao Majestic, quando ainda se conseguia uma mesa e uma rabanada não tinha o preço de um jantar. Que saudades!
Experimentavam-se novas receitas de bolos, comprava-se o ananás, fruta rara naqueles tempos. Ia-se à Leitaria da Quinta do Paço comprar chantilly, do verdadeiro, não essa “coisa” que anda por aí. Outros tempos, outros sabores!
Não havia a paranoia do light e do adoçante (ver sugestão de leitura). Vegan eram as tronchudas (pencas de cá), os grelos, as cenouras, os nabos.
Os CTT funcionavam bem. O carteiro, agora deve ter outro nome pomposo, vinha todos os dias, o que agora não acontece. Sabíamos-lhe o nome. Era o mesmo durante anos. Levava gorjeta pelo Natal. Os cartões de Boas Festas eram ansiosamente esperados e outros tantos eram enviados. Os cartõezinhos, em envelopezinhos, pagavam menos. Ainda tenho todos os que recebi. Agora, só recebo e envio um. Onde estão os votos destes últimos anos, copiados da Internet, cheios de luzes, vidrilhos, movimento, e frases bonitas? Delete!
Parece que o reciclar é um conceito, uma moda, uma descoberta de “famosíssimas” influencers (passávamos bem sem elas/eles) e outros quejandos. As malhas das meias eram apanhadas por senhoras sentadas no vão de escadas, com uma agulha própria e uma pequena maquineta. As camisolas e casacos de lã, quando já pequenos ou gastos, eram desmanchados, faziam-se meadas com a lã, lavavam-se, dobavam-se, juntavam-se novas cores e tricotávamos novas peças bem trabalhadas e bem coloridas. Os apontamentos eram tirados em folhas de papel costaneira, bem mais barato, ou em sebentas, e, posteriormente, “passados a limpo” nos cadernos forrados a pano, ou com fotografias de artistas dos tais filmes que tínhamos visto, ou de cantores e bandas da nossa predilecção.
As sapatilhas não eram ténis e um polo Lacoste ou Fred Perry era um status e duravam uma eternidade.
Nostalgia de quando se utilizavam os tempos verbais compostos, de quando o ‘s não era um plural da nossa língua, como as “ONG’s”. Não existe tal construção. Deve dizer-se, as ONG.
Nostalgia de, meses e meses a fio, como um ritual, ouvir na Rádio Luxemburgo, às 21 horas em ponto, os Platters a interpretar o Only you. Como acabou?
Nostalgia! Velhice! Será? Estou a precisar de um upgrade de um refreshing.
NÃO TENHO nenhuma nostalgia da falta de Liberdade, da repressão, da censura, do cinzentismo, de quem não tinha dinheiro para ter um Natal.
Um Bom Natal para todos!
NOTA – há dias soubemos da morte do actor e realizador Rob Reiner, o Cabeça de Abóbora (Meathead) da série Uma família às direitas. Nem o Archie Bunker aguentaria este Trump…
Nostalgia destas séries.
SUGESTÕES
Ler – Imaginação: cores, deuses, viagens e amores, Francisco Louçã
– Deixemo-nos de tretas! Conceição Calhau
Visitar – o renovado Girassol
(Escrito de acordo com a ortografia antiga)**
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