Quais são as estrelas nas mãos de S. Teotónio?

De olhos postos na Galiza, de Valença vê-se o rio Minho desenhar uma fronteira que é, simultaneamente, rutura e união. A poucos quilómetros do centro da cidade, em Ganfei, a chuva não impede a chegada daqueles que querem celebrar a memória do santo natural daquele lugar: São Teotónio, “o primeiro santo português”, que, à semelhança […]

Notícias de Viana
24 Fev. 2022 4 mins
Quais são as estrelas nas mãos de S. Teotónio?

De olhos postos na Galiza, de Valença vê-se o rio Minho desenhar uma fronteira que é, simultaneamente, rutura e união. A poucos quilómetros do centro da cidade, em Ganfei, a chuva não impede a chegada daqueles que querem celebrar a memória do santo natural daquele lugar: São Teotónio, “o primeiro santo português”, que, à semelhança da geografia da sua terra natal, viveu numa época de união e de rutura, “num tempo de mudança e num tempo de fraturas”, como sublinhou D. João Lavrador na homilia da Eucaristia a que presidiu, e que decorreu no salão da Junta de Freguesia de Ganfei.

De facto, o Bispo de Viana do Castelo acabará por revisitar por diversas vezes este tópico: a semelhança entre o contexto histórico de S. Teotónio e a atualidade, procurando, a partir daí, lançar desafios e pontos de partida. Mais tarde, numa conferência que proferiu, já na sessão solene, no auditório da Escola Superior de Ciências Empresariais, com o título “S. Teotónio: impulsionador de uma nova cultura pelo testemunho evangélico” irá ser perentório ao afirmar: “o nosso tempo é caracterizado por um forte declínio, senão mesmo rutura cultural com enormes repercussões na compreensão da pessoa humana e da sociedade”. Por isso, irá continuar salientando que “tal como aconteceu no “séc. XII, também hoje, somos chamados a um renovado reforço, na consciência de que ‘para dar novo impulso à sua história, a Europa deve reconhecer e recuperar, com fidelidade criativa, aqueles valores fundamentais, adquiridos com o contributo determinante do cristianismo’”.

Na verdade, durante o tempo da sua vida, Teotónio conviveria com o antes, o durante, e o depois da formação da nacionalidade, acabando por acompanhar “a aventura da conquista que introduzia o povo numa nova ordem social, cultural e religiosa”. Daí que D. João Lavrador destaque nele, sobremaneira, a capacidade em indicar “o caminho do discernimento para acompanhar a novidade do que começa”, não fosse ele um seguidor de “Jesus, que ultrapassa o Seu tempo, para responder a todos os tempos”.

“Num tempo de perturbação cultural, de confrontos e de desejo de abrir novos horizontes, S. Teotónio é para nós o exemplo de quem não se resigna a repetir o já conhecido e vivido, a acomodar-se perante o que vem de um passado obscurecido, mas, pelo contrário, se lança na busca das raízes da cultura judaico-cristã e no pisar do solo que manifesta os sinais dos percursos originais de Jesus de Nazaré”, acentua o Bispo de Viana, para quem o santo com origem na raia minhota é o exemplo claro de “alguém que assume o desafio de uma nova evangelização”. Mesmo que, na homilia, já tivesse deixado claro que “só no interior da sociedade e no interior da Igreja é que se pode realizar a verdadeira mudança”, acentuou, ainda, que “a renovação só acontece quando olhamos para o essencial”.

Mas não ficaria por aqui. Como referiria D. João Lavrador, “não podemos perder de vista” o património mais substancial: “toda a vida unificada em Deus”. “Numa sociedade e numa cultura tão fragmentadas, numa visão do ser humano tão parcelar e distorcida, como é importante a luz que a vida de S. Teotónio projeta sobre nós, exigindo o que todos reconhecemos, isto é o sentido da unidade e da transcendência na valorização do ser humano, ser de relação mútua e com o Transcendente”, concretizou, assegurando que o embaraço que a Humanidade hoje sente, deriva de uma autorreferencialidade que obscurece as razões profundas da vida humana.

“Podemos encontrar soluções para as grandes questões que temos diante de nós, mas o problema é que não são soluções humanas, soluções que orientem o ser humano para o fundamento da existência”, garantiu.

Por agora, a chuva parece ter acalmado. Ao sair do edifício da Junta de Freguesia, D. João recebe os cumprimentos de quem foi avisado de que “o dia de S. Teotónio era, também, o dia de anos do Sr. Bispo”. Para trás fica o largo, que aos poucos se esvazia, onde uma estátua de Teotónio, que segura uma corrente de estrelas nas suas mãos, preside ao espaço. Talvez, por esse motivo, se tenha ouvido que ele é “um indicar de caminhos”, um despertador “para a evolução de uma cultura que tem a sua identidade e que se constituiu numa relação muito estreita com o Evangelho”.

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