Pandemia: Crise Litúrgica? 43º Encontro Diocesano de Pastoral Litúrgica

Entre os dias 25 e 29 de janeiro, decorreu o 43º Encontro Diocesano de Pastoral Litúrgica num formato totalmente online.

Notícias de Viana
5 Fev. 2021 7 mins
Pandemia: Crise Litúrgica? 43º Encontro Diocesano de Pastoral Litúrgica

D. José Cordeiro, presidente da Comissão Episcopal de Liturgia, numa mensagem que deixou aos participantes, focou que a Liturgia “não está em crise, porque ela é obra de Cristo e obra da Igreja, apesar da participação na Liturgia ter sido posta à prova”. No último dia, Mons. Sebastião Pires Ferreira agradeceu a todos os participantes e a todos os palestrantes, lembrando D. Anacleto Oliveira, homenageado no início e no fim do encontro. 

Pe. Mário Sousa – “anuncia na tua família quanto o Senhor te fez”: a Palavra de Deus testemunhada e celebrada em famíliaPartindo do Evangelho de S. Marcos, o Pe. Mário Sousa começou por destacar a centralidade da casa, “lugar da intimidade e da partilha da vida”, dentro das comunidades primitivas e no ministério de Jesus. “As comunidades do Novo Testamento são todos Igrejas de Casa (…), onde, para além da família propriamente dita, são incluídos todos os que, pela mesma fé, se tornam membros da mesma família”, destacou, reforçando que, “esta mesma família, já não se compreende pelos laços de sangue ou pelo direito, mas pela vida em Cristo”.  

Neste sentido, afirmando que a fé não é uma transmissão de conteúdos ou de preceitos morais, deixou claro que “mais do que educar na fé, há-de ser a fé, transmitida pelo testemunho, a educar”. “Esta educação realiza-se, sobretudo, pelo exemplo”, reforçou. Com efeito, esclarecendo que, quer o testemunho, quer o discipulado cristão só nasce através da perceção da redenção e salvação pessoal, evidenciou que, por esta via, “a transmissão da fé narra e faz memória dos factos concretos”. Por fim, sublinhou que, neste contexto, a família será o lugar da fé sentida e recordada que, numa catequese narrativa, transporta a uma oração em família que deve ser, sobretudo, “espaço de testemunho do modo como Deus esteve e está presente na História”. “É importante, neste sentido, que nem a família se refugie nos modelos de oração tradicional, (…) nem que os pastores caiam na tentação de se tornarem omnipresentes, como o excesso de transmissões on-line”, concluiu. 

Pe. Francisco Couto: “Para ter comunidade é preciso, primeiro, ser comunidade”“Voltámos ao confinamento e vivemos uma situação bem mais dura e preocupante. Voltámos a fechar as portas das nossas igrejas, pelos menos no que à celebração comunitária e presencial da fé diz respeito. Em boa verdade, o que tínhamos antes?”, questionou o Pe. Francisco Couto, ao iniciar a sua partilha. Neste sentido, o orador saudou o trabalho desenvolvido durante o primeiro confinamento para “manter a ligação com a comunidade”, mas alertou para a sua perda, frisando que o período de confinamento deve ser aproveitado para “cuidar e acordar algumas consciências” da comunidade. “Talvez esta não seja a hora de encher o ecrã de tudo, porque poderá resultar em nada, mas cuidar de quem vê, para que se sinta envolvido e verdadeiramente comprometido. Para isso, deve haver o cuidado em preparar cada momento, quer na igreja, quer em casa. A igreja tem que continuar bela e harmoniosa”, defendeu.

Francisco Couto deixou ainda um desafio: “encontrar ou dar com a ovelha perdida”. “O não poder regressar da mesma maneira, deve levar-nos à oportunidade de repensar como apresentamos, propomos e testemunhamos a fé, como preparamos, celebramos e inserimos na celebração eucarística, e como rezamos e o que essa oração nos faz, apontou, acrescentando que não acredita que “a beleza da liturgia resida simplesmente num número de ministros”.

Pe. José Nuno Silva: “Combater a pandemia da solidão já era anterior à Covid-19”O capelão do Santuário de Fátima, Pe. José Nuno Silva, debruçou-se sobre o tema começando por “fazer a ponte entre o mistério de comunhão, que Deus é, e a experiência da fragilidade humana”, alertando para a gravidade das “dolorosas solidões impostas” pela pandemia. “A minha convicção é que esta crise é, antes de mais, um desafio de discernimento pastoral à Igreja como corpo. (…) É necessário ter consciência da realidade, partilhar a sua experiência e procurar distinguir os sinais que Deus está a enviar através destas circunstâncias”, apontou.

José Nuno Silva destacou “o importante e precioso serviço” dos ministros da comunhão que são “os agentes de pastoral litúrgica, da saúde ou da fragilidade e cuidado”, e especificou “as grandes máscaras” que a pandemia fez cair: a vulnerabilidade, a omnipotência e o individualismo. “Esta crise vai tornar-nos mais humanos. Paradoxalmente, permite-nos voltar à verdade da nossa condição pela privação”. “A solidão tornou-se total, totalizante e totalitária. A experiência da solidão tornou-se o modo de ser de muita gente e, consequentemente, trouxe o medo, sobretudo, o da morte”, alertou.

Desafios e pressupostos da música na Liturgia: que caminho? – Fernando Lapa, Nuno Almeida, Diogo Couceiro e Rui Fernandes Num painel coordenado pelo Pe. Nuno Queirós, Fernando Lapa, compositor, alertou para a necessidade de fidelidade na exceção por parte de todos os músicos, salientando, igualmente, a dificuldade em trabalhar textos demasiado rigorosos que, considera, não são entendíveis. “Faz falta, na Igreja, espaço para outras propostas que possam não ser coincidentes com o habitual”, frisou. 

Neste sentido, Nuno Almeida, maestro, deixou claro que “enquanto a música não for vista como meio para evangelizar, não deixará de ser entendida como preenchimento do silêncio e adorno na igreja”. Nesta linha, alertou para uma cultura litúrgica e musical “amnésica” e “cómoda”, pedindo, por um lado, um equilíbrio no recurso a formas musicais e, por outro, o respeito quer pela identidade musical local, quer pela identidade musical universal.

Já Diogo Couceiro e Rui Fernandes, jesuítas responsáveis do projeto LabOratório, afirmaram que este nasceu de um “grande desejo de renovar, trazer novas linguagens e integrar”, partindo da consciência de uma Igreja que não é homogénea, procurando “devolver o gosto de ouvir música sem rótulos, aprendendo a ouvir e a receber”. Com efeito, focaram, de igual modo, a dificuldade em colocar na prática princípios abstratos de qualidade, reforçando a necessidade um discernimento contextual quanto ao recurso à música litúrgica. 

D. José Tolentino Mendonça – Liturgia e Comunidade perante novos desafios D. José Tolentino iniciou a sua conferência adiantando que, em relação à pandemia, “ainda pode ser cedo para tirar conclusões, para perceber aonde somos chamados a ir”, mas alertou para o facto de também poder ser errado “considerar este ano como um ano a cancelar”, deixando claro que a denominada crise litúrgica faz parte de uma crise global, partilhando com ela desafios e questões. “Anormal seria que, num contexto desta natureza, nós continuássemos a celebrar como se o fizermos dentro de um filtro”, afirmou.

Nesta linha, procurou salientar três crises axiais dadas através deste contexto. Em primeiro lugar, referiu uma crise da centralidade do corpo, alertando para o facto de o virtual não poder configurar um substitutivo da presença física. “O futuro está, por isso, aberto a outras dinâmicas de fé”, enunciou. Em seguida, abordou a crise da centralidade da comunidade, procurando evidenciar que a “experiência de diáspora que vivemos” é um regresso às origens do cristianismo e que permitiu reconhecer “o lugar doméstico, como lugar da celebração da fé”. Por fim, focou a existência de uma crise da linguagem, convidando a que se procurem idiomas novos, capazes de “acender a chama e fazer arder o coração”. 

Tags Religião

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