A greve nacional convocada pela Federação Nacional dos Médicos (FNAM) está a afetar hospitais e centros de saúde em todo o país. Os médicos protestam contra aquilo que consideram ser a “ausência total de negociação” por parte do Ministério da Saúde, liderado por Ana Paula Martins, e contra medidas que “colocam em risco a população” e o próprio Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Em causa estão planos do Governo para concentrar os serviços de urgência a nível regional, uma medida que, segundo a FNAM, deixará “grávidas e recém-nascidos sem cuidados de proximidade”. “Na Margem Sul, por exemplo, as grávidas continuarão a ter de percorrer dezenas de quilómetros para aceder a cuidados de urgência ou maternidades”, denunciou a federação.
A estrutura sindical considera que o Governo se limita a apresentar “atos consumados”, sem abertura para um verdadeiro diálogo. “O que o Governo faz é chamar-nos, apresentar uma proposta e depois dizer: ‘ouvimos as vossas ideias, mas vamos publicar tal como queremos’. Isto não é negociação, é uma farsa”, afirmou ao Notícias de Viana o médico Paulo Passos, representante da FNAM em Viana do Castelo.
Na Unidade Local de Saúde do Alto Minho, a adesão à greve é “muito significativa”. “Temos os blocos central e ambulatório totalmente encerrados. Nas enfermarias a adesão ronda os 80% a 90%, e nos centros de saúde está muito próxima dos 90%”, explicou o médico, sublinhando que “o impacto é exatamente o que se esperava: muito forte”.
Para Paulo Passos, o motivo da greve é “simples, mas essencial”. “Se me pedisse para resumir, diria que é pela defesa do SNS. Aquele serviço de que tanto nos orgulhamos, mas que hoje está a definhar. Vemos partos em ambulâncias, partos à porta de casa… isto não é dignidade, é colapso”, considerou.
O representante sindical lamenta ainda que o SNS esteja a perder médicos para o setor privado. “Médicos há. O que falta é vontade política. Muitos não trabalham no público porque o público não é atrativo. Isso diz tudo. O problema não é falta de médicos, é falta de condições”, sublinhou, criticando com ironia: “Cheguei a sugerir que no cartão de cidadão, em vez de termos apenas o distrito, pudéssemos ter a indicação das estradas principais, como a A28 ou a IC2. Seria mais útil para quem precisa de cuidados urgentes.”
Para Paulo Passos, o balanço da nova governação é “extremamente negativo”. “Falta fazer tudo. O SNS continua a degradar-se e o Governo finge que ouve. O que temos é teatro político, não uma tentativa séria de resolver problemas. “Claramente, a doutora Ana Paula Martins já devia ter saído. Penso que hoje quase ninguém tem dúvidas disso, exceto o primeiro-ministro, Luís Montenegro, e talvez ela própria. Qualquer pessoa com sentido de responsabilidade já teria tomado uma atitude digna e saído”, acrescentou.
Quanto à ULSAM, o médico descreve uma realidade “preocupante”. “Temos carências graves em várias especialidades, listas de espera enormes na cirurgia e condições físicas indignas. No verão há salas onde é impossível fazer consulta. Faltam consultórios, falta conforto e falta respeito, não só pelos médicos, mas também pelos doentes”, apontou, alertando para a gravidade da situação que se estende pelo país. “Não sinto que o SNS esteja a perder. Sei que ele já perdeu. O Estado está a falhar num dos seus pilares. Quando temos partos em ambulâncias, pessoas que não conseguem contacto com o SNS24, e o INEM sem capacidade de resposta, é sinal de que o sistema já ruiu”, lamentou.
Ainda assim, considera que “a luz que ainda existe são os médicos, enfermeiros e todos os profissionais que continuam a dar tudo, muitas vezes sacrificando a família”. “É essa dedicação que ainda mantém o SNS vivo, mas por quanto tempo mais?”, questionou.
A FNAM insiste que a greve é uma resposta à “atitude de bloqueio e desrespeito” do Governo e exige “negociações sérias e transparentes” sobre carreiras, salários e condições de trabalho. A federação acusa o Ministério da Saúde de colocar “os cálculos políticos e financeiros à frente da saúde das pessoas”.
O Notícias de Viana também contactou a ULSAM para perceber o impacto da greve e obter uma reação da administração, mas, até ao momento, não obteve resposta.
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