Os Antigos Paços do Concelho, em Viana do Castelo, acolhe, até 26 de outubro, a exposição “Aconteceu em Viana (1925–1950)”, construída a partir de documentos e folhetos originais que testemunham uma época de reconfiguração e consolidação da vida social e cultural vianense e portuguesa. Resultado de uma investigação do Arquivo Ephemera, em colaboração com o Arquivo Municipal e com contributos de diversas coleções particulares, a mostra percorre um período marcado por profundas transformações no quotidiano, nos hábitos e no lazer, em pleno Estado Novo.
Cartazes, fotografias, programas de espetáculos, recortes de jornais, partituras, objetos curiosos e até documentos com selos fiscais de imposto de espetáculo (obrigatório à época) compõem uma narrativa feita a partir da memória impressa. Como se lê no panfleto da exposição, tratou-se de “um trabalho de recolha, triagem e inventariação”, que procurou revelar “materiais únicos, muitos deles desconhecidos do público”.
Para José Pacheco Pereira, fundador do Arquivo Ephemera, o verdadeiro valor da exposição está em dar visibilidade “à história dos cozinheiros e não só dos Césares”. “No Arquivo Ephemera, mostramos documentos como o diário de uma senhora cega que passou décadas em instituições de assistência, ou cartas de um solteiro que vivia em pensões nos anos 30. São testemunhos que ensinam mais sobre Portugal do que muitos tratados”, explicou, lembrando que o Ephemera tem seis quilómetros de estantes.
O historiador também aproveitou para destacar a importância de preservar este tipo de materiais analógicos no mundo digital atual, sublinhando o risco de “daqui a 10 anos não haver um papel para mostrar”, o que torna esta exposição “uma peça fundamental na salvaguarda da memória local”. “Temos acesso a materiais que revelam a vida quotidiana dos portugueses, desde casamentos a espetáculos, passando por documentos pouco explorados, como correspondências e manuais de trabalho”, especificou.
A responsável pelo núcleo Ephemera de Viana, Isabel Campos, sublinhou o entusiasmo com que o grupo tem recolhido e tratado o espólio da região. “Esta é já a nossa décima exposição, e talvez a mais desafiante”, confidenciou, explicando o processo de recolha e inventário que começou em março. “Fomos atrás dos papéis, literalmente”, afirmou, entre risos.
Entre as peças mais curiosas, destacam-se os cartazes de propaganda com selos do Governo Civil (exigência legal da época), as imagens de orquestras de jazz ativas nos anos 30 e programas de homenagens organizadas por senhoras da sociedade a estudantes universitários, muitas vezes com intenções matrimoniais.
O vereador da Cultura, Manuel Vitorino, elogiou a iniciativa e o trabalho contínuo do núcleo de Viana, destacando o seu papel no mapeamento da memória coletiva local. “Estas exposições não são apenas eventos culturais: são atos de cidadania. Permitem-nos ver quem fomos e perceber melhor quem somos”, afirmou.
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