José Flores (CDU) aposta na habitação pública, transportes e cultura participada para mudar Viana do Castelo

A candidatura da CDU à Câmara Municipal de Viana do Castelo é encabeçada por José Flores, militante comunista, trabalhador fabril e sindicalista, que se apresenta como porta-voz das preocupações concretas das populações. O seu discurso distingue-se pela crítica frontal à narrativa oficial de modernização da cidade, pela centralidade que atribui à habitação como direito fundamental, e por uma agenda política que valoriza serviços públicos, transportes coletivos, comércio de proximidade e cultura participada.

Micaela Barbosa
7 Out. 2025 6 mins

Uma visão crítica da governação socialista

José Flores não poupa críticas à governação socialista das últimas décadas. Questiona a ideia de que Viana do Castelo é, hoje, uma cidade limpa e moderna, argumentando que os problemas estruturais estão longe de resolvidos. Aponta falhas na recolha de resíduos sólidos, na manutenção de espaços públicos e na falta de fiscalização dos serviços concessionados.

Um dos alvos centrais é a concessão da água a privados. Para o candidato comunista, a decisão de entregar a exploração de um bem essencial a uma empresa, representa uma “derrota para o interesse público” e um encargo injusto para os cidadãos, que pagam tarifas mais elevadas do que deviam. Defende a reversão do contrato e a criação de serviços municipalizados que assegurem qualidade e preços justos.

Habitação: salários baixos e casas caras

A habitação é apresentada como a “questão número um” para as famílias vianenses. José Flores parte de um diagnóstico claro: os salários no concelho são demasiado baixos para acompanhar a escalada dos preços, o que impede jovens e trabalhadores de aceder a casa digna.

Critica a visão dominante de que o mercado privado conseguirá resolver o problema. “A habitação não é uma mercadoria como outra qualquer, é um direito constitucional”, sublinha. A sua proposta passa pelo reforço da habitação pública: a autarquia deve construir novos fogos de arrendamento acessível, mas também reabilitar património devoluto e inutilizado.

Defende, ainda, um levantamento rigoroso de todos os imóveis municipais, privados devolutos e abandonados, para que sejam mobilizados em programas habitacionais. Paralelamente, valoriza o papel das cooperativas de habitação, que considera capazes de oferecer soluções intermédias para famílias de rendimentos médios.

Investimento público e fundos europeus

A crítica da CDU estende-se à forma como a Câmara Municipal tem usado fundos comunitários. José Flores acusa o Executivo de privilegiar obras “vistosas”, mas pouco relevantes para a vida quotidiana das pessoas, enquanto problemas básicos permanecem sem resposta.

A prioridade, defende, deveria ser investir em habitação, transportes, saneamento, escolas e centros de saúde. Reconhece que os fundos europeus representam uma oportunidade, mas insiste que é preciso negociar de forma que as verbas não se limitem a financiar grandes empreiteiros. “Os fundos devem servir para responder às necessidades das populações, não para alimentar negócios privados”, afirma.

Mobilidade: transportes públicos integrados e ponte pedonal

Quanto a mobilidade, José Flores apresenta uma visão centrada nos transportes coletivos. Defende uma rede de autocarros eficaz, interligada com zonas industriais e de serviços, que permita reduzir a dependência do automóvel e responder às necessidades de quem trabalha por turnos. Para o candidato da CDU, é inaceitável que haja trabalhadores sem transporte disponível para entrar ou sair das fábricas.

Propõe, também, a construção de uma ponte pedonal e ciclável sobre o rio Lima, como forma de ligar melhor margens e freguesias, promover mobilidade suave e criar um novo ícone urbano. Considera que o projeto é mais útil e sustentável que investimentos em grandes obras rodoviárias, que apenas reforçam o tráfego automóvel.

Em relação ao estacionamento, o candidato alerta para a dificuldade sentida por residentes no centro histórico e nas freguesias mais urbanizadas. Defende que a autarquia deve garantir estacionamento gratuito ou a custos reduzidos para moradores, e que deve travar a tendência para transformar o estacionamento num negócio lucrativo para concessionários.

Comércio local e gentrificação

O candidato da CDU mostra preocupação com a situação do comércio tradicional no centro histórico. Aponta que muitas lojas fecharam portas, substituídas por cadeias ou por espaços voltados apenas para turistas. Para José Flores, a Câmara Municipal não pode limitar-se a embelezar ruas: deve criar políticas que apoiem pequenos comerciantes, como reduções fiscais, dinamização de mercados de proximidade e apoio a iniciativas coletivas.

Denuncia, ainda, a gentrificação do centro histórico, que considera expulsar moradores de longa data e transformar a cidade em “cenário turístico”. A política de habitação pública e de arrendamento acessível é, na sua visão, também uma forma de travar essa tendência.

Cultura e juventude: participação e descentralização

A cultura é outro dos pontos fortes do programa da CDU. José Flores rejeita o modelo atual, que acusa de concentrar a programação em grandes eventos ou em iniciativas pontuais, sem continuidade. Defende a criação de um fórum cultural anual, que reúna artistas, associações e cidadãos, para definir prioridades de forma participada.

Propõe, ainda, a criação de uma Casa Municipal da Juventude, espaço dedicado a atividades culturais, recreativas e formativas para jovens, e a instalação de um Museu do Mar, que valorize a identidade marítima de Viana do Castelo e funcione como atrativo turístico.

Para o candidato comunista, a programação cultural deve ser distribuída ao longo do ano, descentralizada pelas freguesias e acessível a toda a população, em vez de concentrada no centro urbano.

Trabalho, salários e serviços públicos

Na sua visão, a questão da habitação está intrinsecamente ligada à dos salários. José Flores sublinha que a realidade laboral do concelho é marcada por baixos rendimentos, precariedade e horários desregulados. Defende que a autarquia deve ser voz ativa na exigência de melhores condições de trabalho, pressionando Governo e empresas locais.

Os serviços públicos são, igualmente, prioritários. O candidato critica a falta de médicos de família em várias freguesias e a insuficiência das respostas sociais, sobretudo para idosos. Propõe reforçar a rede de apoio domiciliário e garantir que os centros de saúde funcionam em horário compatível com as necessidades da população trabalhadora.

A ambição da CDU: crescer e representar

A candidatura de José Flores inscreve-se numa estratégia mais ampla da CDU: reforçar a sua presença autárquica em Viana do Castelo, onde tem tradição de ligação ao movimento sindical e às populações rurais. O candidato admite que não parte como favorito, mas insiste que o objetivo é crescer, alargar representação e influenciar decisões.

A mensagem política é de proximidade e de compromisso com direitos sociais. “Não prometemos o impossível, mas lutamos pelo essencial”, afirma. No essencial, coloca habitação pública, transportes coletivos, cultura participada e defesa dos serviços públicos, como as pedras basilares de uma alternativa comunista em Viana do Castelo.

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